segunda-feira, 30 de março de 2009

O Ferro-velho cap 3


Boneca de pano


Isaura saiu, o choro apertado na garganta, os cabelos desgrenhados, alguns tufos arrancados na briga, a calça suja de sangue. Ia pensando no caminho, pensando na proposta que Jean lhe fizera de ir para Paris e, quanto mais pensava, mais remorsos sentia por ter de deixar a maloca e seu piso de chão batido, terra vermelha pelo seu sangue e do menino, de soluços impregnados em frágeis palafitas.
E enquanto descia morro abaixo, carregando de seu só os molambos que trazia no corpo, recordava com pesar do pequeno embrulho que Romulo a proibira de levar por pura maldade... Vira pela última vez o filho de nove anos e o bebê de nove meses, suas figuras foram sumindo nos olhos embargados e sofridos daquela mãe em meio a uma cegueira de desespero e culpa.
Alina crescera vendo o irmão abandonar a escola, mentir para o pai, rastejar por uns trocados, trabalhar de dia para comer à noite. Crescera no casebre de poucas peças, dormindo na cama do irmão, abraçando-o forte para sentir que o pai a hora que chegasse, não a fizesse mal nenhum... Romulo não mais trabalhava. Recebia uma pequena pensão por sua invalidez, já que ficara coxo devido a um acidente na obra, e a gastava toda no bar onde bebia e jogava com os amigos. Mas apesar de tudo, Alina era feliz, feliz com a boneca que o irmão lhe trouxera àquela tarde.
Felicidade era uma coisa difícil de se definir por ali, um lugar triste por si só, com seus dias penosos e regados ao suor daquela gente, que no mais, trabalhava, sofria e vivia. Não raras vezes via-se um sorriso na boca de uma velha logo que as lágrimas cessavam de escorrer ou um volume na barriga da mãe que a pouco perdera o filho, vítima de bala perdida, fato não espantoso. Mesmo assim, ela jurara: esse não poria os pés na escola, pois o primogênito um dia de lá nunca retornara, levando a esperança de seu pai bandido que já o via doutor.
Portanto, felicidade era uma palavra muito ampla a qual alguns preferiam dizer que iam levando, levando suas vidas sentados na varanda de suas malocas enquanto observavam sem surpresa, o carro dos traficantes passar com seu bando de garotos empunhando armas, não sendo barrados nem mesmo pelos cães que os fitavam de longe, ganindo baixo e silenciando logo depois.
Alina nem percebera o tempo passar, ficara tão entretida no quintal de casa que não vira o irmão chegar. Com o short curto que estava, com a blusa sem sutiã que desnudava os seios pontudos, abraçara-o sem qualquer constrangimento, na inocência de seus doze anos. Suada e cheia de terra, ele a xingou, pois ser pobre não era sinônimo de ser sujo, banho era muito bom! Ela recolheu-se manhosa para a ducha fria. Percebera em seu olhar uma satisfação, um excitamento que jamais vira, uma coisa estranha que só via em atores de TV, na casa de sua vizinha. Ele estaria apaixonado? Será que finalmente esquecera a prostituta, a tal de Marcinha, que sequer seu nome verdadeiro sabia?
A toalha rala enrolava seu corpo juvenil sensualmente. Havia ficado curta, pois ela crescera muito neste último ano: seus peitos e quadris apareceram, as pernas antes magricelas e desengonçadas tornearam-se, a menstruação lhe indicava que era já uma moça...e ele não ficara indiferente a essa transformação.
Ao despontar no quarto, vira-lhe nu em cima da cama. Quis tapar os olhos, mas não conseguiu mover-se; lembrava das horas em que tomavam banho juntos, de quando não tinham pêlos, quando eram crianças e ele ainda permitia-se sorrir. Porém essa intimidade foi desaparecendo à medida que Alina se desenvolvia: o pudor, a vergonha de mostrar-se, fez com que se afastassem. A descoberta de que eram agora homem e mulher os havia perturbado enormemente, mais a ele que à ela.
Alina sentia-se constrangida quando à noite acordava com o membro intumescido do irmão nas suas costas...não sabia bem o que acontecia, nem o porquê, mas preferia não perguntar...Tinha medo que aquilo fosse uma coisa feia demais para falar-lhe. A curiosidade morria quando o sono teimava em cerrar-lhe os olhos.
Mas ele continuava a olhá-la, cada vez mais como dizer...“apaixonado”. Ele a agarrou sem dar tempo para pensar em nada: simplesmente a jogou na cama.

Nenhum comentário:

Postar um comentário