quarta-feira, 30 de julho de 2014

A desnecesárea

Tenho uma conhecida no facebook a contar ansiosamente a chegada do bebê, a cada dia ela põe hashtag de como o tempo passa devagar e a conta se não me engano anda pelos quatorze dias. Podemos pensar que ela refere-se ao termo da gestação em que a qualquer momento pode ser a hora "P", aquela coisa meio de filme: a bolsa estoura, as contrações apertam. Mas não é nada disto. Ela vai fazer cesariana, já li nos comentários. Tem qualquer problema que impede um parto normal, e eu até acreditaria nisto se o país em que ela vai parir não fosse o Brasil, onde a rede privada anda com uma média de 70% de cesáreas.  Tenho de dizer o óbvio: não sou contra este procedimento quando é necessário, o problema é justamente o abuso desta cirurgia, porque é disto que se trata, é uma cirurgia em que o resultado é sair de lá um bebê. Fico pasma como se trata levianamente como se fossem lá colocar uns mililitros de silicone por estética. O exagero é tanto que estes tempos, uma atriz chegou a antecipar algumas semanas o parto para que o filho nascesse com determinado signo (!!).  O bebê ficou semanas na incubadora e sujeitou-se a todos os riscos de uma criança prematura por um simples capricho. 
Estava pensando agora, de todas as amigas e conhecidas que tenho, nenhuma teve filho por parto normal. E depois ao perscrutar os olhos pelos sites de famosos, constato que cesariana é quase sinônimo de parto como se só houvesse esta opção. Estranho é quando a pessoa decide durante a gravidez ter um natural, mas sabe-se lá o que acontece a meio que quando nasce,  surge lá um probleminha e o resultado foi encarar a faca. 
Este quadro tem muitos responsáveis, primeiro as mulheres, porque não querem sentir dor. A expressão aquela que usamos para coisas difíceis "foi um parto", está com os dias contados. Um parto nunca foi tão fácil como querem fazer parecer. A ignorância faz as futuras mães associarem um parto normal a um parto semi-medieval, com doulas, paninhos quentes e muito, muito sofrimento. Epidural está aí,não seja por isto minhas senhoras! Segundo, há mulheres que querem um parto natural, mas rapidamente se dão conta de que estão nadando contra a maré. Ouvem coleções de histórias horripilantes de bebês de cinco kgs, de bebês que não deram a volta, de vaginas rasgadas, de horas de dilatação, ah e o cordão! Ah, o cordão enrolado no pescoço, esta é clássica. Eu sou uma das que nasceu de parto normal com o cordão enrolado e ó para mim vivinha. Depois de tudo isto, as coitadas acabam convencidas de que seguro mesmo é deixar tudo nas mãos dos médicos, e a elas agora cabe deitar e relaxar. E por último, os médicos, estes carniceiros (não todos, mas aqueles que não podem ver uma grávida que já trazem o bisturi) que não respeitam a escolha da mulher. Ademais, para estes o parto cirúrgico apresenta apenas vantagens: é rápido, o seguro de saúde paga mais, é controlado, e pode acomodar em sua agenda pelo menos três por dia. Desta forma, aproveitam cada consulta para medir o peso e o feto, para dizer que é muito grande, que sua bacia por sua vez é muito estreita, que para que sofrer se ela pode passar a "fase parto" e pensar nas visitas no hospital. E que quem sabe já deixam marcado para uma sexta que aí tem um final de semana e os que moram longe podem vir, porque é sempre melhor que conheçam o novo integrante da família no quarto do hospital ao invés de se amontoarem no sofá da sala. E é assim que aos fins de semana lotam maternidades com recém nascidos e dizeres na rede social de que nasceu (exatamente no dia em que haviam previsto quase oito meses atrás). 
Meu parto não foi lá aquelas maravilhas, mas não foi ruim. Claro que se eu soubesse o que sei hoje, teria participado mais (pelo menos não teria deixado me fazerem episiotomia) porque o parto é antes de mais nada nosso, a começar com a escolha de como ele deverá ser conduzido. Os médicos, grandes deuses da vida e da morte, expulsaram séculos de sabedoria passada de mulheres para mulheres. Hoje o nascimento se dá na maioria das vezes, em um ambiente asséptico em que a mulher é despida de qualquer  iniciativa, permanecendo sob os holofotes apenas como atriz coadjuvante e passiva. E por este andar,  não demorará muito para dizerem que parto normal é aquele em que fica ali um corte de dez centímetros no ventre como souvenir. Parto selvagem, com gritos e  sangue? Isto é para animais...ou no sentido mais humano da coisa, de filmes antigos.

12 comentários:

  1. Eu tive as minhas duas filhas de cesariana. E esse é um dos meus maiores desgostos, porque queria as duas de parto natural sem epidural. A primeira, caí na conversa da obstetra e deixei que me provocasse o parto às 38 semanas e 5 dias, quando não tinha dilatação nenhuma. Resultado: doze horas de trabalho de parto para 3 dedos de dilatação e bebé em sofrimento, cesariana de urgência.
    Na segunda, que nasceu menos de dois anos antes da primeira esperei até às 40 semanas e 5 dias, fiz quilómetros a pé, tomei chás e fiz tudo o que me indicaram para entrar em trabalho de parto. Ela já estava com 4, 5 kg. A médica (outra) achou que era um risco esperar e um risco provocar o parto, porque eu não tinha estrutura óssea para aguentar um bebé tão grande. Resultado: cesariana marcada. Chorei baba e ranho.
    Como não conto ter outro, pois já tenho 41 anos, tenho como desgosto principal nunca ter, verdadeiramente dado à luz um bebé. Porque na verdade, não fui eu que as pus no mundo: tiraram-mas.

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  2. Timtim, sinto muito pela tua experiência... agora que li mais sobre o assunto, percebo que apesar de eu ter passado horas a me informar sobre parto, não sabia que a médica tinha feito o descolamento da membrana e assim, provocado contrações exatamente quando completei 38 semanas. Não é justo que os médicos tomem para si as decisões sem sequer nos consultar, aliás, nem justo, nem ético! Defendo a cesariana quando tem de ser, e eu mesma não pensaria duas vezes se o meu caso tivesse exigido. Porém acho que no Brasil a banalização está beirando a loucura. A isto acrescentamos a falta de informação e a pressão dos obstetras que chegam ao ponto de dizerem diretamente que não fazem parto normal. Enfim...há tanto para dizer sobre isto...
    Beijinhos

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  3. Eu fui a xiita do parto humanizado na minha gravidez. Assisti vídeos, documentários, relatos... Cantei pros 4 ventos que iria parir normal!
    quando estava com 38 semanas meu ginecologista falou "olha, se você não entrar em trabalho de parto até sábado (era uma quinta) você vai ter que fazer uma cesárea de emergência. Sua placenta tá grau II, ele não encaixou e tem pouco líquido aqui. Seu bebê está em sofrimento". Chorei horrores, minha vontade era de correr pro mato e esperar a Hora P. Abandonei meu ginecologista e no dia seguinte fui fazer uma ultrasson morfológica, que disse que o bebê estava muito bem, obrigada!
    Esperei em casa, e as vésperas de fazer 40 semanas começou o trabalho de parto.
    Pra garantir que ia conseguir fui pra um hosp. público, mesmo tendo convênio etc. Pq aqui no Brasil só fazem cesárea no público se você estiver morrendo.
    Foi meu maior erro, o lugar era um AÇOUGUE... No primeiro toque URREI de dor... e ali levava 2 exames de toque por hora (cada um com uma pessoa diferente), tiravam o sangue coagulado do aceesso na veia e jogavam na parede! Isso, a parede do meu "box" tava toda suja de sangue! Sem falar que me furaram 6x, e em uma delas meu braço ficou sem circulação.
    Fiquei 20h com 5 cm de dilatação, acho que o medo travou meu TP.
    Acabei fugindo do hosp. e indo pra um particular e pedindo uma cesárea 'peloamordedeus'. É a minha maior frustração!

    Eu acho que não posso sair dessa vida sem ter a experiência de um parto normal, mas como você sabe, a maternidade está me traumatizando. (A começar pelo parto, rs)

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  4. Luna, nem sei o que dizer... Infelizmente não somos respeitadas nem mesmo no momento mais delicado em que estamos muito frágeis para este tipo de tratamento. Todos os toque que tive eu estava com anestesia, embora sentisse dor mesmo assim, fico imaginando se não tivesse anestesiada como seria. Neste ponto de atendimento tive sorte, passei a madrugada fazendo dilatação com uma médica só para mim (era a única gestante no hospital naquele dia) e duas ou trêsenfermeiras.
    Beijinhos

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  5. Amigas, eu tive minha filha há 14 anos, de parto normal, em hospital público.Confesso que traumatizei a ponto de jurar lá no hospital que nunca mais passaria pela experiência da maternidade. Apesar de ser profundamente apaixonada por minha filha e por crianças, não tive outro e nem terei. Me desculpe a dona do blog, mas achei parto natural uma coisa brutal.Pode até ser que outras tenham tido melhor experiência, mas a mim, foi um calvário. E olha que sou uma mulher forte. Tão forte que dois dias depois do parto, cheguei em casa, pus minha filha no berço e fui lavar roupas no tanque... Também já me internei sozinha,fiz cirurgia com anestesia geral sem sequer um familiar ou qualquer acompanhante comigo. Passaria por tudo de novo, menos por outro parto. Desculpe novamente se estou sendo aquela pessoa que o texto critica, que fica aterrorizando os outros. Apenas quis dar um testemunho sobre o tema em questão. Espero que as maternidades tenham um olhar mais humano para as parturientes e que ninguém fique traumatizada como eu.

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  6. Amigas, eu tive minha filha há 14 anos, de parto normal, em hospital público.Confesso que traumatizei a ponto de jurar lá no hospital que nunca mais passaria pela experiência da maternidade. Apesar de ser profundamente apaixonada por minha filha e por crianças, não tive outro e nem terei. Me desculpe a dona do blog, mas achei parto natural uma coisa brutal.Pode até ser que outras tenham tido melhor experiência, mas a mim, foi um calvário. E olha que sou uma mulher forte. Tão forte que dois dias depois do parto, cheguei em casa, pus minha filha no berço e fui lavar roupas no tanque... Também já me internei sozinha,fiz cirurgia com anestesia geral sem sequer um familiar ou qualquer acompanhante comigo. Passaria por tudo de novo, menos por outro parto. Desculpe novamente se estou sendo aquela pessoa que o texto critica, que fica aterrorizando os outros. Apenas quis dar um testemunho sobre o tema em questão. Espero que as maternidades tenham um olhar mais humano para as parturientes e que ninguém fique traumatizada como eu.

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  7. Olá seja bem-vinda! Não há que pedir desculpas, todo mundo é livre de discordar. Eu não achei o meu o fim do mundo, só senti p-me estranha quando passou a placenta e o efeito da anestesia começou a diminuir. Eu devia ter informado a médica pois senti ela me costurar depois, enfim...
    Beijinhos!

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  8. Não concordo que as mães que escolhem parto cesáreo devam ser criticadas.
    A idealização da maternidade já é bastante negativa para as mulheres. Não precisamos idealizar também o parto normal. Nos comentários há alguém que diz "Não fui eu que a pus no mundo"... Como não? Claro que foi, que absurdo. Por que diminuir a experiência só porque o parto foi cesáreo? Por que sentir-se frustrada? O bebe nasceu bem? Saudável? Você foi respeitada nas suas decisões? É isso que conta! Vamos ser mais tolerantes e abertas umas com as outras, e, sobretudo, com nós mesmas. Não vem ao caso a forma pela qual você pariu, desde que tenha sido uma escolha consciente. Não há problema em sentir medo da dor. Eu tive meu filho por parto cesáreo. Não marquei data para não interferir no desenvolvimento dele. Entrei em trabalho de parto, e só então contatei a minha médica e fui para o hospital. Ainda assim não foi mole. A recuperação de uma cesárea é muito mais complicada e dolorosa. Porém eu já sabia, fiz minha escolha consciente e refletida.
    Então, amigas, vamos ser mais tolerantes e menos seletivas para com nossas limitações?

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  9. Seja bem- vinda Ana! Em primeiro lugar, temos que ser realistas, quando esta escolha é "consciente"? Quando esta escolha nao é fruto de um sistema que privilegia o parto cesário como única escolha? Quando que a mulher não "escolhe" baseada no medo e pressão impostos, além da ignorância? Medo da dor...eu não gosto nada de sentir dor, no entanto eu pesquisei e vi que podia ter um parto vaginal com analgesia, assim como minha mãe teve. Tive a sorte de em Portugal não ter esta política da cesariana que há no Brasil. Talvez tenha ficado a impressão que critiquei as mães porque as pus em primeiro lugar, mas critico muito mais a comunidade médica que permite e perpetua esta prática.
    Como vês, não sou nem a favor nem contra parto humanizado ou xiita do parto com dor. Nem digo o que devem fazer, apenas aponto os números absurdos de cesária no Brasil.
    Beijinhos

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  10. Eu por enquanto anônima leitora dos teus textos!
    Encontrei algo em que nos identificamos!
    Te admiro pela forma como divagas em teus delírios de pensamentos e os expõe em teu blog!
    No mais continuo totalmente contra de como vês teu filho!
    Abraços e felicidades!
    Tomara te encontres e que o ames antes que seja tarde demais!

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  11. Tive minha filha de parto cesarea e não me arrependo !!! Nunca gostei de sentir dor e tinha muito medo de ter filho por via baixa. E se a cabeça não passar ? E se a cabeça passar e o corpo ficar entalado ? E se tiverem depois de muito sofrimento que me cortar toda depois p/ sair o bebê, sera que teria valido a pena tentar ter naturalmente ?

    Enfim, minha filha resolveu vir ao mundo antes do tempo (5 semanas antes) , nao tinha virado na minha barriga, não estava "pronta" e a bolsa tinha estourado, me guardaram no hospital !

    Como foi num atendimento de emergência de hospital vieram médicos, enfermeiros e sage-femmes, normal ou cesarea ? Fui taxativa: quero cesarea !
    -Mas você sabe q cesarea é uma cirurgia, q não vai ser natural ?, (disseram tentando me convencer...)

    -Podemos tentar virar o bebê c/ manobras (eles queriam q fosse normal de qualquer jeito) !!!

    Ainda bem q veio a plantonista, uma médica novinha, anjo de Deus, e falou que ia fazer a cesarea imediatamente !

    Minha cirurgia foi um sucesso, não senti nada, pos-operatorio melhor ainda, cicatriz muito discreta e tive mais 15 dias p/ dormir, comprar roupinhas p/prematuro e curtir meu marido, pois minha filhinha estava na neonatologia sendo muito bem cuidada :)
    Quando me perguntam sobre o assunto normal ou cesarea falo que depende de cada uma : se fores corajosa e tiver indicação, tenha normal ué ! Ah, mas respeitem as escolhas por cesarea, cada uma sabe de si :)

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  12. Ana, ainda bem que correu tudo bem! Eu só crítico é a banalização com que está escolha é feita no Brasil, enfim, parece que tenho que corrigir, as cesarianas na rede privada andam por volta de 84%.
    Beijinhos

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