E agora Maria ? São três filhos para criar, um deles recém nascido. Tens 45 anos e tiveste uma pneumonia logo que saíste do hospital. O marido faz horas extras, as crianças exigem atenção. E agora Maria? Não tens com quem contar, a não ser tua velha mãe com quase 80 anos. Em três meses ela foi e voltou três vezes para o Rio. E agora Maria? Andas a cambalear sem forças para gerir a casa e levar os mais velhos à escola. Tens de ir à pé com a bebê nos braços. Tens o mundo nas costas. E agora Maria? Estás no hospital e não sentes nada. Não sabes de nada, mas sei eu. Sabemos todos. Tens leucemia mas ainda não te diagnosticaram o tipo. E agora Maria? E agora minha tia?
Poema de Drumond, cujo título do post é expressão muito usada por aqui.
- JOSÉ
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
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