Tenho saudades daqueles passeios que dávamos aos finais de semana, mesmo quando não tínhamos carro íamos quase sempre que tivesse tempo bom. Andávamos pelas ruas tortas e quase desertas de Lisboa, pelo Chiado, pelas casas de portas pequeninas e ceroulas balançando ao vento. Andávamos de mãos dadas, um puxando o outro, o outro puxando o um. As vezes tropeçando pelas pedras e lembro em muitas ter me valido teu braço forte quando ao invés de folgadas as pedras se tornavam zombeteiras e escorregadias. Olhamos as vitrinis, perturbamos as pombas, corremos atrás de estátuas e certa vez ficamos (não, fiquei) fã de uma torrada que se fazia em uma tasca. E lá como somos pessoas de hábitos íamos sempre sentar à mesma mesa e pedir a mesma coisa com um suco de laranja. Ficávamos a observar cães passarem, assim como as conversas alheias e ríamos a olhar um para a cara de espanto do outro. Sim, lembra daquela senhora e do neto a elogiarem os óculos de um tal de António, ou seja lá como se chamava o pobre iludido do homem? Ó mas com estes óculos é que se vê mesmo bem! Dizia o rapaz que sequer precisaria de um. E toca o seu António a pagar a companhia o consumo das duas criaturas que fingiam pior do que uma criança de dois anos.
Depois continuávamos à pé a descida até o Cais do Sodré, passávamos pela loja de animais, o que sempre rendia uns "óinnn que fofo", viu aquele? E aquele? Sim, eu também lembro que algumas vezes insistias para atravessarmos a rua antes, ao que só me sentia menos triste por não ter de suportar o fedor de peixe ao lado da loja. Chegávamos e seguíamos a viagem de meia hora até o Estoril. Eu sentava à janela para ver o mar e as pessoas caminhando no paredão. Tu apertavas a minha mão e a beijava com os nossos dedos entrelaçados e assim víamos o pôr do sol, com pena de ter de voltar a nossa casa. Sim, quando ainda tínhamos casa. Éramos muito felizes e sabíamos.
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