Acho interessante as pessoas que dizem que gostam de mudar, ou que nos desafiam a ser pessoas mais maleáveis. Mudar não é fácil. Seja de país, seja de estado de espírito. Seja de manequim, seja de idade. Seja para casar, seja para ser pai. Quem diz que mudança é fácil deve ser algum mentiroso compulsivo ou coisa assim. A verdade é que o ser humano é uma espécie de hábitos, que gosta de uma certa rotina, que se acostuma, é verdade, com quase tudo, mas que leva imenso tempo para tal. Antes de aceitar, fica geralmente a bater com a cabeça, a dar murro em ponta de faca e a desejar ardorosamente que as coisas voltem a ser como eram. Que a realidade se adapte a si. Sim, é claro que o passado é que era bom. Parecemos crianças birrentas a lutar contra a maré. E aí...cansamos...nos adaptamos.
Demorei cinco anos para me adaptar em Portugal. Lembro-me das brigas que tinha o o marido porque queria voltar. Porque não suportava o sotaque português. Não queria ligar a tv, não queria sair à rua. Aquilo incomodava-me. Aqueles erres, aqueles eles, aqueles tês e o som anasalado da pronúncia me feriam, agrediam-me de um modo que não consigo explicar. Era como se me lembrassem o tempo inteiro que era uma intrusa, que não pertencia aqui.
Não fiz esforço algum para gostar de Portugal. E na minha cabeça nem havia espaço para isto. Simplesmente um dia acordei e dei por mim a achar normal ouvir este sotaque em toda a parte, já não prestava mais atenção em como chegava a mensagem, mas na mensagem em si. Deixou de ser importante os acentos, as diferenças de cultura, o meu sentido de preservação finalmente relaxou. Tinha conquistado meu espaço.
Tudo isto para dizer que, embora varie o tempo de adaptação, mudança é sempre trágica, no sentido em que é uma morte. Uma parte de nós morre naquele momento, mas não morre fácil, agoniza, clama atenção, ao mesmo tempo em que se inicia um parto difícil. Morre e nasce algo diferente e geralmente o processo é tão lento que não sabemos ao certo o momento em que deu-se a ruptura entre o velho e o novo. Daí não fazer qualquer sentido uma pessoa que queira mudar. Porque? Porque quando se quer mudar a qualquer custo, cria-se uma resistência, porque a vida tem o seu tempo para acontecer. Por isto a frase que li no Livro do Perdão, fazer muito sentido: mudança não é uma coisa que se faz, mas uma coisa que se permite. Ou seja, não é um processo ativo, mas pelo contrário. Então não me venham dizer que é fácil, viu mensagens de facebook?