Neste mês tivemos a visita de uma prima do marido com o seu esposo e o filho. Era para ficarem pouco mais de uma semana, mas depois de várias mensagens postergando a estada ora porque iam dar uma passadinha na Normandie, ora porque resolveram voltar à Itália para conhecer Pisa, ora porque isto ou aquilo, acabaram por ficar aqui três noites apenas. Já tinha virado gozação entre nós, "o que foi, a fulana vem amanhã? Não, resolveram de última hora já que é tudo tão perto, dar uma passadinha na Índia antes. E talvez estiquem até a China, quem sabe?".
Dois mil e muitos quilômetros depois e meio milhão de fotos pelo caminho, o resultado foi pelo menos duas pessoas na metade dos quarenta de olhar cansado, sendo puxados pelo filho dela, uma espécie de criança hiperativa de 22 anos. Não é exagero dizer que mais da metade das fotos eram exatamente iguais, tirando o pano de fundo que variava de três a quatro vezes por dia. Eles conheceram a capital Suíça, umas dez cidades italianas e praticamente quase todas as regiões francesas em vinte dias. E eu estou aqui há dois anos e só conheço Strasbourg, Paris, a estação de Nice e pouco mais. Admito que deu uma certa inveja no começo, mas depois vi o que eles chamavam de turismo e para mim, mais se assemelha a um estado permanente de ansiedade em fotografar tudo do que propriamente algo prazeiroso que é realmente conhecer outros lugares.
Todas as noites, assim que conseguiam o sinal de Wi-Fi do hotel, ela descarregava 80, 90 fotos do passeio do dia. As mesmas fotos de ombro e tiradas de um ângulo de cima. Fico pensando e também faço a auto-crítica, se não houvesse Facebook, quão exponencialmente cairia a necessidade de fotografar tudo e mais alguma coisa? Se não houvesse para quem contar, ou como era "antigamente", apenas os familiares e amigos próximos soubessem que dia tal estaríamos em Malága e que voltariámos alguns dias mais tarde, haveria esta necessidade de provas?
Tento vasculhar minha memória à procura de quando isto foi um comportamento aceitável, mas não encontro. As pessoas viajavam, claro que havia os que se gabavam de viajar, as máquinas eram de rolo, as fotos eram menos repetitivas, levava-se uma eternidade para saber que afinal saímos com os olhos fechados ou vermelhos em metade delas. Mas não havia este desespero em provar que viajamos de verdade, que não nos socamos dentro de casa incomunicáveis. Realmente pudemos bancar a fortuna de uma passagem de avião à Europa, realmente andamos de gôndola e vimos a torre Eiffel e o Louvre (mesmo que não tenhamos entrado para não perder tempo). Hoje parece que as pessoas viajam para os outros, e o fazem com o cuidado de nos manter bem informados de como é bonito o teto da capela Sistina e de como são estreitas ruas de Bergamo mesmo que eles não tenham se dado conta disto, estavam mais preocupados em não esbarrar no pau de selfie alheio. Duvido que guardem memória daqui dois ou três anos. Se não fossem estes registros pouco criativos, talvez pensassem estar tendo um déjà vu, caso voltassem a passar por lá.
Durante o período que eles estiveram aqui, não ouvi em nenhum momento demonstrarem entusiasmo ou felicidade pela viagem. Pelo contrário, pareciam estar presos em um pesadelo e que não viam a hora de acordar. Sem saber me conter eu disse: é, agora acho que vocês vão precisar de umas férias para descansar destas...
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