sábado, 2 de agosto de 2014

Coisa de menina


O Fabian chegou em uma idade em que começa a expor o que já absorveu do nosso mundo adulto e o primeiro sinal disto foi a famosa frase: isto é de menina, não quero! E eu retruco, não é só de menina (ou de menino quando diz o contrário), tu podes brincar com o que quiseres.
Peguei-o diversas vezes a imitar os diálogos que tinha com o pai, desta vez passados entre ele e um filho imaginário, o Fabian pequeninho, como ele diz. Assim, quando eu lhe perguntava com quem estava falando, respondia que o filho não o obedecia e que vivia mexendo no carro dele e que era muito perigoso. Pegando pela mão invisível de um bebê, ele caminhava ao redor da sala, levava-o para a escola e se despedia para ir trabalhar.  Eu achei que estava na hora de comprar-lhe uma boneca.
Este ato primeiramente não aceito pelo meu marido, refletiu uma das coisas que eu queria mudar, que é aquilo de dizerem que o homem  "ajuda" em casa. "Ajuda" com os filhos, "ajuda" a cozinhar. E quantas vezes esta frase já me saiu da boca ou quantas escutei por aí? E as mulheres que tem homens que as "ajudam", sentem-se especiais e donas de uma sorte tremenda face àquelas em que o cara é praticamente um filho a mais para cuidar.
 Versa o ditado que para mudar o mundo basta começarmos pelo nosso quintal, portanto nada mais óbvio do que enxergar a chance pequenina que tenho diante de mim. Eu não quero que meu filho "ajude" sua companheira (ou companheiro), eu quero que ele partilhe, o que vai uma grande diferença. Ajudar pressupõe que alguém é sobrecarregado ao invés de encarregado de determinada tarefa ou no caso da gerência da casa e da educação dos filhos, significa além disto que é um trabalho preponderantemente feminino.  É verdade que dos tempos dos meus avós para cá as coisas vem mudando, porque antes não havia sequer a vontade de ajudar. Então o próximo passo seria este, ensinar que todos são responsáveis pelo funcionamento de seu núcleo familiar, cada pessoa é tão importante quanto outra e por haver uma divisão clara de tarefas ou entre-ajudas, não é nenhum favor que o homem faz ao cozinhar, passar roupa, dar banho nos filhos. 
Através do lúdico as crianças introjetam valores e práticas que os vão guiar pela vida adulta, sendo um completo despropósito dar exclusivamente panelas e bonecas para meninas e carros e legos para meninos e esperar que vinte anos depois os papéis sociais não estejam tão engessados quanto a divisão do mundo em rosa e azul. 
Brincar de bonecas e casinha não é novidade para o Fabian, acostumado a dividir com os colegas os brinquedos da pequena casa de madeira montada na sala da escola. Pegar o bebê de plástico, colocar entre os braços, falar-lhe docemente e empurrar o carrinho, não é garantia nenhuma de que ele será um pai e marido fantástico. Mas é a melhor forma de contribuição que uma mãe pode fazer para que se termine de uma vez por todas esta divisão desigual de tarefas. Não queremos só uma mãozinha...nós queremos os braços, as pernas, queremos o corpo todo. 

2 comentários:

  1. Gente, que incrível é você. Muito bom estar criando seu filho longe de preconceitos e e estereótipos.
    Criando para ser um ser humano de verdade.
    Conheço tantas mães "felizes" de "príncipes" e "princesas" aqui no Brasil que me fazem ter nojo da ideia da maternidade.
    Todas as vezes que pensei estar grávida (já sou casada há 2 anos) fui tomada por um desespero... Afirmei ao meu marido que abortaria, caso estivesse grávida, ao passo que ele discordou e disse que não me apoiaria nesse ato.
    Eu só me imaginava como a personagem de "Foi apenas um sonho" (o livro maravilhoso de Yates).
    Enfim, nunca estive grávida, não pretendo agora, mas se algum dia eu tiver um filho, pretendo criá-lo e tratá-lo do modo como percebo que vc o faz (através desse recorte do blog que acompanho): livre de obrigações.
    Acho que nisso vc tem sorte em estar morando longe de familiares.
    Aqui ia ser difícil conter críticas de avós/ tias, etc.
    Obrigada por dividir conosco suas experiências.

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  2. Ana, seja bem-vinda! Fico feliz que tenhas gostado do blog, se leres mais para trás tem coisas meio assim...preconceituosa. Mas vou deixando, é a minha evolução, né? Enfim, só quando fui mãe comecei a me questionar sobre isto, que é ridículo esta forma engessada de pensar e dividir o mundo entre menino e menina, entre permitido e proíbido. Tmbém ajudou o fato de morar em outro país que me permitiu olhar para a minha cultura de outra forma. Ainda quero falar disto aqui.
    Beijinhos

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