domingo, 27 de abril de 2014

Telhado de vidro



Inscrevi-me em um grupo de discussão de jovens feministas há um mês e neste pequeno período já consegui enxergar muitas coisas que nunca tinha dado importância. Mais ou menos como achar que tudo esteve sempre lá e não há razão nenhuma para que a a ordem seja esta e não outra. Mas o que tenho notado agora, nem é tanto a questão do movimento feminista por si mesmo, mas a forma como as pessoas se relacionam, ainda que virtualmente. A quantidade de mal entendidos que afloram pelo simples fato de não estarmos atentos a outros sinais que estão a nossa disposição em uma conversa física: o olhar fugidio, o tom da voz, a risada ou a voz tremida. Uma coisa que é dita de forma neutra pode ser interpretada como um pavio aceso, pois que a pessoa sente-se atingida, ofendida e sei mais o que. À parte questões óbvias a nível de desconstrução de um discurso racista, classista, machista a que fomos habituados desde a infância, noto que também há uma certa apropriação do que escrevemos para questões pessoais mal resolvidas.
E digo isto porque hoje ao falar com uma amiga no Brasil sobre o post do meu blog que ela também está acompanhando, tenho me deparado com respostas e agressões que estão além do que acho um nível normal de indignação.  E ela disse que para começar, eu deveria ficar feliz, que o meu objetivo está a ser alcançado. A gente incomoda quando pensa diferente. Eu por alguma razão, incomodo estas mulheres. Porque hein? 
O interessante é que dá para ver direitinho quem discorda sem levar para o lado pessoal e quem sente-se ferido e irritado porque eu tenho o direito de pensar de outra forma. 
Aproveitei a ideia para pensar no quanto eu fiquei incomodada com este grupo no início. Como ele atingiu meus preconceitos, meus medos, meu racismo. Sentei e observei. Critiquei (aqui comigo) e li e li e li. E procurei ter  empatia com o crossdresser que colocou suas fotos vestido de mulher, procurei ver o sofrimento da jovem negra que ainda hoje tem raiva de gente branca, procurei ver a pouca flexibilidade minha e alheia para com a dor dos outros. E é difícil para caramba. Porque depois de um tempo a gente se acostuma com o que é e com o que pensa, mas é aí que já tá na hora de mudar de novo, de abrir mais um pouco a cabecinha e deixar entrar coisas novas. Sempre digo que o ser humano é um ser de hábitos e que tende a se acomodar, que não gosta de experimentar insegurança mesmo no campo das ideias. E se olharmos bem para a história veremos que demos saltos graças à coragem de alguns, pois que a massa sempre vai é arrastada como na música do Lulu "com passos de formiga e sem vontade" .
E é isto: incomodar gera reflexão. Isto é, se a pessoa permitir, se ela analisar a sua própria reação de raiva, de medo, etc e tentar descobrir porque vem à tona estes sentimentos. Quando algo nos incomoda é um sinal de alerta para o pó que deixamos assentar na nossa casa interior. E não podemos nos esquecer que toda casa tem teto de vidro, justamente para podermos  reconhecer nossa fragilidade na fragilidade dos outros.

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