sábado, 28 de junho de 2014

Já vou dizendo que a culpa foi toda minha


Poucas coisas marcam mais uma pessoa do que uma experiência de quase morte. Tive-a eu quando andava pelos nove anos, e olhando para trás, foi tão bobo que nem sei como aconteceu. Estávamos eu e uma amiga em uma piscina daquelas que dão pé nas extremidades, mas que vão se aprofundando aos poucos até chegar perto dos dois metros no meio. A minha amiga usava bóias nos braços aos sete anos e eu achei boa ideia lhe ensinar a nadar, nem que fosse cachorrinho. Depois andamos a brincar, ela agarrada nas minhas costas enquanto eu pulava dentro da área que a água me batia ao peito. Isto foi até o meu pé escorregar centímetros a dentro da rampa da piscina. A minha amiga em pânico, rapidamente agarrou-se ao meu pescoço e me empurrou para baixo. É impressionante como o cérebro em milésimos de segundos nos dá uma pronta decisão. Eu embaixo d'água pensei: calma, isto é fácil, estou mesmo na borda, é só me agarrar e puxar a B. e estamos salvas. O problema foi ela desesperadamente agarrada aos meus ombros, não me deixando espaço para nenhuma manobra. E a filha da boa senhora ainda quando estava com a cabeça de fora não gritava por socorro. Coube a mim esta tarefa, e aí sim já estava agoniada o bastante, completamente desesperada a lutar por uma golfada de ar e ao mesmo tempo chamar a atenção. Não sei quanto tempo durou, porque quando estamos à beira da morte o tempo deixa de fazer sentido. Lembro-me de pensar aos nove anos de idade que eu ia mesmo morrer e que ia ser tão ridículo morrer com o braço quase a alcançar a borda que até era bem feito pela minha teimosia. 
O final da história não é surpresa, senão nem estaria aqui. Meu padrinho e mais um homem se jogaram e nos tiraram da água. Isto para dizer que nunca, mas nunquinha mesmo nós sabemos como vamos reagir a uma experiência de risco de vida. Vejo gente que julga e desmerece pessoas que reagem a assaltos, por exemplo, quando já estamos carecas de saber que não se deve fazer nada, ou gente que fica parado quando outro cai nos trilhos do trem, etc. Para mim há dois tipos de pessoas: as que agem e as que se deixam afundar pelo desespero. E volto a dizer, não há maneira de saber qual tipo somos senão o fato de estarmos à mercê de nossos instintos. 
Felizmente não desenvolvi fobia a água, no entanto toda a vez que vejo cenas de afogamento em filmes, dá-me um nó na garganta, meu coração acelera e vejo-me agoniada sem perceber que fico a prender a respiração. Meu corpo revive automaticamente como se tivesse sido ontem e quase me vejo a balançar os braços e a submergir com metade dos gritos a morrerem em minha garganta. Ar...ar...ar...Um suspiro fundo traz-me à tona os instantes necessários antes de sufocar os dedos do marido.

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