Tenho de fazer um esforço para lembrar...já faz tanto tempo. Diria que três, não, quatro meses. A verdade delegado, é que nem ao certo sei quando ele começou a me fazer falta. Estava eu passeando pela rua, você sabe, portando o meu sorriso. Não é um qualquer, porque todo mundo acha que é tudo igual, mas não é. O meu sorriso era assim do tamanho (medindo os dedos ao redor da boca. Olhar impaciente do ouvinte). Não sei, senhor, e não sei porque variava. Às vezes cabia uma nesga de sol, às vezes um Magnum de caramelo, às vezes expandia-se tanto que eu podia engolir o mundo inteiro. É...era um sorriso especial, não assim que fosse melhor que o seu delegado, mas é que era o meu. E não entendo como alguém pode ter a coragem de roubá-lo, ele não estava fazendo mal a ninguém, estava restrito e amarrado ao meu rosto...
O delegado retira por momentos os olhos escondidos pelas sobrancelhas pretas:
- Você é estrangeiro?
- Sim, senhor. Sou brasileiro.
O homem solta um suspiro.
- Já não é o primeiro caso. Estava a ponto de por um cartaz no tram a avisar.
- Então, já sabem quem foi?
O homem chega-se à frente, debruçando-se sobre a papelada que os separava, disse em um tom conspirador:
- Nunca lhe contaram que aqui adoram roubar sorrisos?... Fazemos assim: deixe os seus contatos, se acharmos o seu nós avisamos. É por isto que a gente logo vê quem não é daqui. Há que ter muito cuidado e uma vez com ele, evite de deixá-lo à solta por aí.
- Normalmente eu lhe apertaria a mão sorrindo, mas...
- Eu entendo, com o tempo o senhor se acostuma. - "Ces étrangères et l'habitude de penser que peut sourire impunément dans notre pays".
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