Escolhi meu cachorro pelo tamanho da merda que faz, e daí? Daí que todo o santo dia tenho, não uma bosta qualquer, um senhor cagalhão na calçada. Merda nova, fresquinha. Se não gostasse de vocês, até botava uma foto aqui. Nem seca uma, já tem outra em algum lugar. Ando atentamente, mesmo com pressa de não perder o horário de buscar o Fabian. Vejo que às vezes se espalha por metros levada por algum pneu de bicicleta, sendo que certo dia chegou mesmo bem em frente à minha casa, nem abrir a janela eu pude. Que culpa tenho eu que o fulano escolheu ter um bezerro ao invés de um cão? Ele que ande com uma pá e um saco de supermercado porque nem naqueles saquinhos próprios aquilo cabe. Ou vou escrever (que agora ando muito dada a bilhetinhos desaforados) que "isto é o que meu dono tem na cabeça"! Nem sei se assim está gente vai lá, mas tenta-se.
sexta-feira, 5 de dezembro de 2014
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
Se é para o meu bem e felicidade exclusiva do meu coração...digam ao povo
Que me mudo!
Queria ter a inocência ou a cabeça dura de outros tempos em que acreditava em soluções definitivas e vibrar com esta notícia. Não que uma parte de mim não exulte, mas lá no fundo há uma certa desconfiança, pois que a vida mostrou-me que não nos quer muito parados já que é a oitava vez que arrumo as malas em um período de dois anos. E no entanto, esta é a única que acredito mesmo ser para melhor...só não sei até quando.
Desde que o marido agarrou com unhas e dentes este emprego na Alsácia, sabíamos que era apenas um recomeço, uma linha nova, um ponto de partida temporário, visto o salário ser muito justo não permitindo grandes aspirações que não viver um dia após o outro fazendo uma ginástica para chegar ao fim do mês. Um ano se passou em que não via o seu trabalho reconhecido, em que o salário mantivera-se muito abaixo do limite de sua experiência. Os sacanas dos franceses mostraram-se negociantes como os de qualquer parte do mundo, em que explorar o desespero alheio é apenas um detalhe, um objetivo a preencher na meta ao fim do mês.
Porém quando tudo encaixou tão perfeito, com uma sincronia absurda, eu comecei a acreditar que aquilo só tinha mesmo de ser, como naquele ditado: quando é para acontecer, até quem atrapalha ajuda. E assim sem nem ter procurado, a vaga pulou no colo do Fernando e as entrevistas e o resultado vieram na mesma semana. Um longo período de separação, ponte aérea Nice-Strasbourg, passagens promocionais, depressão, quilos (a mais para mim, a menos para ele), um Fabian choroso, um outono frio para cacete, e enfim, respira, estamos quase na linha de chegada! A sina do apartamento também está quase. Quase como eu pedi. Grande, perto de um maternal, da estação do trem, da praia e com um terraço (que "num guento" estender roupa dentro de casa). Agora é correr atrás de empresas de mudança mais em conta, colocar este imóvel para alugar, comprar o bacalhau para o Natal e, talvez algures entre o meio (meu aniversário) e o final de janeiro, estejamos entrando com o pé esquerdo, lá está, sou canhota, logo o esquerdo é que é bom, na nossa nova casa. Ano novo, vida nova. Por mim parava por aqui. Não me importava nada de ficar velhinha pegando o meu chapéu e a cadeira de praia para enterrar meus pés no mar da Cotê d'Azur.
sábado, 29 de novembro de 2014
Que será será
Amanhã fará precisamente três meses que lancei os dados, empurrei o marido rumo ao sul e me encastelei no nosso castro alugado. Aproxima-se o dia em que iremos saber se todas estas fichas foram bem apostadas: se ganharemos uma vida com a qual sempre sonhamos, perto do mar e com um salário que nos permitirá pela primeira vez estarmos mais folgados ou...nada. Se vamos observar apaticamente que a vida nos raspe as esperanças todas de uma só vez.
Acordei mais rabujenta do que nunca, com um frio que não me saiu do corpo nem mesmo com um banho quente. Às vezes acredito estar em alguma espécie de show da vida tal como naquele filme do Jim Carrey. Parece tudo tão artificial, as pessoas com quem troco um bonjour, que sorriem apenas porque a polidez as obriga, as que esbarro na entrada ou saída da escola. Parece tudo um plano para ver até quando vou aguentar este isolamento auto infligido. Alterno raiva e impaciência. Não nasci para esperar e detesto não ter controle sobre o destino. É verdade que fazemos escolhas, mas há uma grande parte em que ficamos à deriva de nossas próprias expectativas. Iremos a bom porto ou de encontro a uma tempestade furiosa?
Em meio a uma ansiedade que não me deixa, entrego-me sem cerimônia aos doces e já tenho alguns quilos a mais para se juntarem aos outros, seria mesmo sensato pensar que estou de esperanças. Ou de medo ou os dois... gêmeos que dividem o mesmo corpo e me sugam com igual intensidade.
quarta-feira, 26 de novembro de 2014
Das coisas que detesto
L
Listas. Listas sem fim. E pessoas que acreditam nelas. As dez coisas que não se deve dizer para o namorado; as quinze coisas que nunca devemos dizer para os filhos, para a mãe, para a sogra, para o cachorro, periquito, para a vizinha que tem tara que é uma atriz pornô. E são sempre coisas óbvias, tipo não devemos ter uma DR* depois do marido bater com o mindinho na quina da porta. Não devemos xingar a sogra de hummm...qualquer dos nomes queridos que nos passem pela cabeça. Não devemos dizer que o Aroldinho não estaria aqui (#benzaDeus) se não tivéssemos tomado aquele antibiótico que terminou por cortar o efeito do anticoncepcional. Oh céus se nos escapa alguma alarvidade pela boca, vai ser um traumatizado pelo resto da vida, um daqueles quarentões que vão me trazer meias sem pares para lavar, cuja sorte amorosa estará em minhas mãos! Começo por apresentar a do 704 que tem mais pelos de gato do que... Não, péra.
E as coisas que devemos fazer antes de morrer? Skibunda em alguma praia do Nordeste, sexo selvagem com um desconhecido, gastar o décimo terceiro com sapatos, lançar um blog fashion adviser. E logo eu que odeio blogs fashion adviser!
E a lista de coisas para ser feliz hein? Hein?! Quem diria que comer panqueca com frutinhas de mato ia me fazer tão realizada... "Tire momentos a sós". E tudo o que uma mãe pensa é que vai ser o máximo poder fazer cocô sem ninguém a dizer a cada cinco segundos: blérc! Mas como faz? Já inventaram um WC bunker?
Obviamente não podemos esquecer da lista para um corpo perfeito! Beba água! Coma de três em três horas, corte frituras! Corte refrigerante! Corte doces! Corte os pulsos!
As únicas listas de que verdadeiramente gosto são as de sugestões de lugares turísticos, de resto passo bem sem estes conselhos. Só tenho receio de que letras minúsculas tragam aquelas coisas de que se não passarmos esta lista idiota para doze pessoas, vamos queimar no inferno cibernético, ter a nossa conta de e-mail deletada, ninguém mais irá aceitar nossos pedidos de amizade, nem curtir as nossas selfies com bico de pato. O Armagedom de nossos tempos nos tornará mais ignorados do que testemunhas de Jeová em manhãs de domingo, nos deixará em um completo e indefinitivo ostracismo virtual!
* discutir a relação.
terça-feira, 25 de novembro de 2014
Há emigrantes e emigrantes
Ouvindo a minha vó contar sobre uma amiga portuguesa da época obviamente de quando minha tia vivia em Portugal, quase fiz aquele suspiro de pesar. Oh, coitada, vai ter de sair do país dela e tudo...sei como é! Mas a vó continuou dizendo que ela já estava morando no Rio e que inclusive estava aos poucos se instalando em um apartamento...no Leblon.
Poker face do outro lado da linha, mas a vó não percebeu. Depois de um longo silêncio, ainda disse embasbacada: tem certeza vó, só no Leblon?!" Só" o cenário preferido das novelas do Manuel Carlos em que uma Helena desfila num doce balanço a caminho do mar? Tá bem então! Parece que o marido dela vem como um dos diretores da Oi, empresa de telefonia brasileira...
***
Ontem estava acompanhando uma discussão em um fórum de brasileiros em que uma mulher casada com um francês estava sofrendo muito com a proposta que tinham feito ao marido. Acontece que ele é diretor de uma empresa que implantou uma sede no Brasil (diz que por ideia do próprio) e agora lhe ofereciam a oportunidade de gerí-la por três anos. Três anos em que pagariam um salário maravilhoso, manteriam o alto padrão de vida ajustado aos custos da cidade de São Paulo que é caríssima, pagariam escola para suas filhas. Mas não uma escola qualquer, e sim a melhor escola da cidade, arriscaria dizer do país, uma internacional com ensino em francês além de inglês. E não satisfeita, a mulher torcia para que o marido se desse mal com os futuros colegas e detestasse viver no Brasil, pois ele poderia voltar a qualquer momento e reocupar o cargo deixado na França.
Quisera eu ter sido um destes tipos de emigrantes, aos quais é reservado o direito de reclamar das banalidades da vida, e olha que até me considero bem sortuda. Nunca passei fome nem precisei enveredar pela chamada vida fácil que de fácil não tem nada. Já dizia Zeca Pagodinho "na vida coisa mais feia é gente que vive chorando de barriga cheia".
Blogger
Duas coisas a dizer:
1- Que merda é esta de por três fontes diferentes nos meus posts?? O aplicativo do Blogger é um doido, sempre me faz isto!
2- Parece que para comentar blogs temos de provar que não somos um robô digitando alguns números. Já tentei tirar isto do meu, mas é impossível. Supostamente esta medida serviria para mantê-los afastados, mas ou um robô conseguiu se passar por gente ou isto não adianta de nada, pois tenho spam na mesma.
Que tipo de mãe você é?
Mãe carrasca!
Sabem aqueles testes idiotas do facebook? Pois é. Desde que o pai se foi há mais ou menos três meses, que o Fabian tem estado a travar uma guerra aqui em casa: a do almoço. Eu sempre disse que não ia ser daquelas mães que ajoelham e pedem por favor para que coma mais uma colherinha. E realmente não sou, sou do tipo que berra, que faz negociações natalícias (no estilo papai Noel está vendo isto!), que chantageia (vou desligar a tv!) e finalmente, do tipo que sacode os ombros. Não quer comer? Azar o teu! Hoje foi para a escola no período da tarde sem ter comido nada mais do que uma colher que por muito custo enfiara na boca. Mas foi muito bem avisado de que quando retornasse não iria encontrar a mamadeira quentinha de sempre, ao invés disto, eu prometi esquentar novamente o almoço recusado e nada mais. Ainda lhe disse que esta era a primeira e última vez que faria isto, pois há três meses ando a brigar no momento em que mais quero sossego. Amanhã se ele voltar a fazer fiasco, fica sem comer e quando voltar vai comer fruta, e eu só esquento o prato do almoço na hora de jantar.
Sinceramente não queria tomar estas atitudes, mas eu sinto-me esgotada e sozinha...não há ninguém que possa me tirar o peso de ter uma criança birrenta para eu arejar a cabeça. Muitas, muitas vezes chego no meu limite...e não quero fazer como uma conhecida em que a filha alimentava-se somente de pipoca. O caminho da educação não tem verdades absolutas, bem sei, mas devemos desconfiar quando as coisas são fáceis demais tão e somente porque não queremos nos incomodar...
sábado, 22 de novembro de 2014
Saudades eternas
Dos cabeleireiros do Brasil. Sério, é a última vez que assassinam os cabelos do Fabian. Tadinho...
Acho que a especialidade deles é a franja da Angelina Jolie em "Garota Interrompida".
Ou aprendo a cortar cabelo ou entramos daqui uns tempos no livro dos recordes de maior juba do mundo.
quinta-feira, 20 de novembro de 2014
Update filmográfico
Stonehearst Asylum
E se os loucos dominassem o hospício? E se os médicos fossem presos durante tempo suficiente para enlouquecerem? |
Costumo brincar dizendo que dificilmente vejo mais do que um filme marcante por ano. A maioria é uma porcaria apenas para passar o tempo, alguns gatos pingados são dignos de um espaço na minha memória; agora aquele filmaço que mexe comigo e me põe a questionar a vida, ah, este dá-me tanta alegria que se torna impossível guardá-lo só para mim!
Stonehearst é uma adaptação de um conto de Edgar Allan Poe, ambientado no século 19 em uma Inglaterra fria e cheia de bruma. Numa época em que a loucura era mais do que um estigma mental, tornando-se socialmente rechaçada, os doentes que padeciam deste mal eram trancados em lugares ermos, isolados como se fossem portadores de qualquer coisa muito contagiosa. Os métodos para a cura passavam por choques, banhos de água fria, camisa de força, isolamento total. Tais métodos poderiam muito bem serem mais eficazes para enlouquecer do que para o propósito a que se destinavam.
Esta é uma obra inteligente, daquelas que colocam o dedo na ferida e deixa-nos com um certo incômodo filosófico. O que é loucura? Seríamos nós naquele tempo considerados loucos por alguma particularidade que hoje é tida como natural? Sabendo que seu conceito é fluido e que já abrangeu tanto a homossexualidade quanto o simples ensejo de prazer por parte das mulheres, a loucura não deixa de ter um papel na nossa sociedade. Tal como os gregos diziam que era necessário haver escravos para que o homem livre possa saber-se livre, é necessário existir a loucura para que se possa perceber a sanidade.
Hysteria
Doutor, mais um pouquinho para a direita, não, mais para cima...mmmm isto, ai.. oh... |
Novamente a Inglaterra sob pano de fundo para esta comédia (na verdade eu vejo como tragicomédia porque a vida sexual feminina naqueles tempos é de chorar), um jovem médico frustrado com a teimosia de seu antigo superior, resolve mudar de especialidade e acaba em um consultório a tratar de mulheres histéricas.
Antigamente pensava-se que as mulheres eram temperamentais, inseguras, agressivas, tudo por possuírem um útero (hystera em grego). A histeria era uma condição tão abstrata que se poderia manifestar qualquer comportamento e/ou condição física para ser diagnosticada como histérica: apatia, palidez, cólera, frigidez, vontade de fazer sexo, dor de dentes, desmaios, etc. O tratamento variava entre sessões de hipnose, consulta psiquiátrica e masturbação profissional, sendo que nos casos mais graves optava-se pela retirada do órgão.
Mentalidades dominadas pela ideia do sexo como um ritual sagrado, pela vergonha, culpa e sofrimento pelos desejos reprimidos: à mulher basicamente não permitia-se sentir prazer. Fico pensando como era as dondocas tão cheias de pudor a arreganharem as pernas para o médico fazer-lhes uma "massagem na vulva". A cura através de um orgasmo. Casto. Legitimado por uma questão de saúde física e mental da paciente. Chega a ser tão caricato que é difícil acreditar que tenha acontecido.
Em meio a isto, o novato depara-se com a filha mais velha do seu patrão: um caso incurável de histerismo beirando à loucura. A jovem benemérita passa o seu tempo a ajudar os mais necessitados, sonha com o voto feminino e a igualdade dos sexos mas, que pela rudeza do pai em não aceitar suas escolhas, grita e o enfrenta. Histérica. Este era o diagnóstico dado a qualquer mulher que ousasse requerer seu espaço em uma sociedade dominada pelo homem. Um filme para pensar... Ainda que a mulher possa votar, frequentar uma universidade, escolher com quem irá se casar, será mesmo que superamos esta visão tão século 19? Ou ainda somos tachadas de pouco racionais, emotivas, justificando-se tais características pela fisiologia feminina seja através da crença de cérebro distinto, seja pelo ciclo menstrual? Por que esta suposta instabilidade é fortemente ligada à negação de uma vida sexual plena? Por que qualquer coisa é motivo para ofender de mal amada ou mal comida ou pior, soltar a famosa expressão "isto só pode ser falta sexo"?
De qualquer maneira, um grande chupaaaa para Freud e suas teorias do ciúme do falo: há por aí de todos os tamanhos e cores (e com várias velocidades também). Este filme conta acima de tudo, uma história sobre a compensação feminina e a busca pelo protagonismo de seu prazer.
terça-feira, 18 de novembro de 2014
Bla bla bla meritocracia
Eu já estou tão cansada de dizer o óbvio, mas parece que ainda é preciso. Quando falo que o Brasil deveria ser um país de bem estar social, e que fico feliz com algumas medidas afirmativas (embora estejam longe do ideal, são muito mais do que grande parte da população já teve), não estou falando em premiar os que nada fazem. Dói ver alguns conhecidos estufarem o peito e dizerem: estou aqui onde cheguei por mérito próprio. E dizem-no enquanto rosnam contra as cotas para os pobres, negros e índios nas universidades públicas, contra as bolsas que o governo oferece para que os pobres ponham as crianças na escola ao invés de estarem nos semáforos a pedir dinheiro. Dói e não só dói como dá vontade de falar que merecem sim, uma ova ou um ovo (podre) nesta cara.
Ao dizerem que merecem estar ganhando quatro, cinco mil reais, ir a Miami ou andar em um carro zero por fruto de seu trabalho, estão agindo como esquizofrênicos sociais. Mais ou menos isto: dois obesos necessitam emagrecer. Enquanto um tem dinheiro e faz uma redução de estômago, o outro tem que penar, passar fome, caminhar na rua ouvindo "lá vai o botijão", olhar muitas vezes frustrado para a balança que não baixou quase nada. Depois de meio ano, o gordo que fez cirurgia emagreceu trinta quilos, enquanto que o outro com muito esforço perdeu dez. Ah mas a culpa é dele que é preguiçoso! Podia ter levantado mais cedo e aumentado em duas horas o treino de cardio. São assim, estes queridos amigos e conhecidos que pensam com tal arrogância que chegaram onde estão por mérito tão e somente deles e dos pais que trabalharam para que pudessem receber uma boa educação.
Há por aí uma charge que infelizmente não encontrei... trata-se de duas crianças, uma está em cima de um livro roto no qual está escrito "ensino público", e tem um homem a olhar para ela dizendo que não consegue alcançar o sucesso porque não se esforça o bastante. A outra está em um plano elevado por uma dezena de livros, em que se lia coisas como "tempo livre", "aulas de inglês", "cursinho de vestibular", "intercâmbio", "ensino privado", etc, etc. Ao seu lado estão seus pais a vibrarem e a seguinte mensagem: vai lá, filho! Você merece!
Não quero dizer que é mau ter tido a oportunidade que tivemos, mas que é cinismo esquecer de que somos privilegiados. Ora, encontramos a estrada pronta e asfaltada, sendo uma escolha nossa percorrê-la ou não. Enquanto outros tem-na esburacada e cheia de interrupções, pedágios e obstáculos, culminando em subempregos mal remunerados. Como disse a atriz Thaís Araújo (uma das poucas atrizes negras da Globo), "não há nada de errado em ser doméstica, o problema está em sê-lo por falta de opção". E é aí onde quero chegar: quando as chances de crescimento se equipararem para todas as classes sociais, cujo ponto de partida passa a ser o mesmo, só então poderemos falar em mérito por uma ascensão social e/ou econômica. E não me venham lá com a história do Silvio Santos contada como se fosse novela mexicana: de camelô a dono de emissora de tv. Porque a única coisa que a meritocracia faz, é premiar os que já estão na ribalta, com a papinha mastigada, e sendo bastante realista, são estes o que na verdade menos se esforçaram para chegarem onde estão.
segunda-feira, 17 de novembro de 2014
Fabionices
Ao ver eu trocar a lâmpada queimada, o Fabian disse:
"Sabia que na nossa casa é a felicidade que faz tudo funcioná?"
"Sabia que na nossa casa é a felicidade que faz tudo funcioná?"
Acho que ele quis dizer "eletricidade", mas bem que seria interessante pagar a conta de luz com sorrisos e abraços. (Só não sei se a Énergies Strasbourg ia achar graça).
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Mãe, a chuva cai quando a nuvem se sacode? E sai água pra cima e pra baixo também?
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Mãe, podemos fazer un gateau d'anniversaire no Natal para o Père Noël comer na casa dele? Ele vai gostar muito! *
* Não sei o que andaram dizendo na escola, mas ele esta pensando que quem nasceu neste dia foi o Papai Noel...
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Mãe, podemos fazer un gateau d'anniversaire no Natal para o Père Noël comer na casa dele? Ele vai gostar muito! *
* Não sei o que andaram dizendo na escola, mas ele esta pensando que quem nasceu neste dia foi o Papai Noel...
O Bisa ( ou vô Schuch como eu chamava)
Você disse bala? Não sei de bala nenhuma. |
Houve um tempo em que o meu bisavô morou com os meus avós. Lembro-me pouco dele, cada vez que tento mentalmente desenhar o seu rosto, é como se existisse um filtro destes de instagram que deixam tudo embaciado. Ele quase não saía de casa, tinha uma poltrona de couro escuro recostada na janela, da qual conferia cuidadosamente a obra do que mais tarde seria o prédio da Policia Federal no outro lado da rua.
Meu bisavô tinha os olhos azuis que passara em molde a minha vó e o corpo magro de ossos largos como o dela. De maneira que hoje olhar para minha vó, é reconhecê-lo através deste véu. Dizem que era tão austero e seco, o alemão, que nem as filhas, nem os cinco netos um a um foram capazes de amolecer aquele mau gênio. (Mas que eu o fiz). Sinto-me orgulhosa disto, embora não saiba muito bem o porquê nem como.
Lembro-me de pedir-lhe balas de menta; "bainha fóti". E que ele me dava sempre, para o desespero da minha mãe, mesmo antes do almoço. Mas eu prometo que como tudinho, eu chorava. Minha mãe tinha já a enorme mão branca estendida em direção a minha boca. Momentos antes, o meu dilema era se escondia na curva do céu da boca e falava "mmmmm mmmm" ou se a punha para um dos lados e respondia a desafiar à mãe, que não, imagina, eu não tinha comido bala. E a sua expressão a encarar a filha boca-de-hamster oscilava entre a irritação e o esganar de um sorriso.
Um dia meu bisavô foi para um asilo e de lá não retornou. Fui visitá-lo uma ou duas vezes, mas achava estranho tanta gente velhinha junto e o modo como me olhavam saltar e correr, tinha a impressão que incorporava muitas figuras de seu passado. Quem sabe uma filha ou neta ou até mesmo eles quando ainda tinham as pernas ágeis e o fôlego quase infinito.
Meu padrinho conta que o bisa nunca deixava os bolsos da camisa vazios, havia sempre uma bala de menta para mim. Houve muitas balas enquanto ele morava naquele apartamento, sentado à janela. E quando morreu eu não pude vê-lo, mas não chorei, nem perguntei nada. Foi a primeira vez que encontrei com a morte, vi-a de muito longe...a segunda vez foi de lado, a terceira de frente e a quarta de raspão. Todas doeram de uma maneira distinta. Embora eu naquela época com a idade do meu filho não soubesse precisar o quanto podia ser definitiva, esta deixou-me um gosto na boca, ou a falta de um sabor de menta...
sábado, 15 de novembro de 2014
Tipo "Ensaio sobre a cegueira" ou Walking Dead mesmo
Chego no mercado com a minha carrocinha que é como eu chamo aquela sacola com rodinhas e vejo um cenário catastrófico, digno de filmes de apocalipse zumbi. Prateleiras vazias, algumas sem nenhum artigo. Agitação dos funcionários estoquistas: nunca, nunca, nunca vi coisa igual. Será que lançaram alguma promoção ao estilo pague um e leve três? E eu que só queria comprar pão... não tem. Mas e salgados? Não tem. E bananas? As únicas coisas que jaziam ali eram batatas e alfaces. Lá consegui salvar um pack de iogurtes agarrando-o como se fosse um tesouro esquecido. É meu, ninguém me tira! Lancei um olhar desconfiado em roda da ala dos congelados.
Dirigia-me ao caixa quando li em um dos cantos da prateleira um bilhete impresso em letras ordinárias: no sábado, dia 15, esta loja irá fechar às 16 horas. Mas por quê??? Olhei para o relógio e percebi que faltavam apenas cinco minutos. Perguntei à funcionaria enquanto ela me estendia uma dezena de moedas, por que estavam fechando tão cedo. Acontece que iam mesmo se mudar, coisa que tinha esquecido depois de ter sido marcado para outubro e nunca mais mencionarem fazê-lo. Pois agora era assim? Não põem um aviso na porta duas semanas antes, nem isto nem o novo endereço do mercado? Não duvido nada de que aquele aviso tenha sido plantado na véspera ou quiçá no próprio dia. Irrita-me muito esta historia do "se virem" aqui na França. Dá-me vontade de dizer que isto não funciona no comércio onde o cliente é como um bebê que adora ser bajulado e carregado ao colo. No Brasil este setor de marketing ia mirrar à fome. Querem ver que a lógica é o cliente sair por seus pés a adivinhar para onde é que o Simply foi? Oh, claro que já estou me vendo fazer isto, vou é no Lidl isto sim!
Sexy Yemanjá
Está aberta a temporada de fotos de pés na areia, da ostentação de quem tem um pedaço para a cadeira e o guarda-sol, sim que isto do sol nasce para todos é verdade: tanto para os que vão para o litoral quanto para os que ficam a torrar nos quarenta graus de Porto Alegre (ou Forno Alegre como é mais conhecida por estes meses de verão). E isto só me faz aumentar a ansiedade de ir morar novamente perto do mar. Vêm-me musicas solares, ainda dos tempos de infância, de quando desejava que a minha mãe esquecesse de me tirar da frente da tv na hora da novela das seis.
Creio que a minha memória musical é ainda melhor do que a visual e ultimamente tenho me "enliado"* em canções antigas e as ouço em looping, às vezes mais alto do que costumo. Já não tenho tanto cuidado com os vizinhos que resolvem discutir a relação da meia noite até a uma da madrugada com direito ao homem esmurrando a porta e estar mais de dez minutos a massacrar a campainha, enfim. Fodam-se, que ouçam eles também.
A música tem sido uma parte importante nestes momentos de solidão, tenho necessidade de escutar a minha língua, quase como se duvidasse da minha capacidade de retê-la, como se não quisesse esquecer-me de quem sou. Sempre achei este processo de adaptação moroso e dolorido... Até quando estou me adaptando e até quando estou me aculturando? Ainda não consigo escutar nada em francês, com exceção de duas músicas, nem tenho interesse de procurar algo que me agrade.
Começo com Sexy Yemanjá, tudo a ver com o mar, viajo para escutar a voz rouca do Fernando cantando "Apesar de você amanhã há de ser outro dia" enquanto distraidamente seca a louça, volto para Chega de Saudade, passo por Espelhos d'agua (que vontade de perguntar se ainda é cedo)...E termino com Maluco Beleza controlando minha maluquês misturada com minha lucidez. Posso dizer que já estou em outro nível de loucura: nem falo mais com os meus amigos imaginários, estamos de mal. Deu para notar que pensei em falar sobre uma coisa e terminei com outra, mas no fim, acreditem que está tudo ligado. A loucura. A solidão. Os pés no facebook.
*enlaçado à moda da minha terra.
sexta-feira, 14 de novembro de 2014
Onde está Wally?
E estando novamente nestas andanças de percorrer sites de imobiliárias em busca do "tal", tenho observado o pior drama de um corretor: espelhos! Coitados, fazem de tudo para não aparecerem, mas lá fica o registro de um pé, um topo de cabeça, a mão com a câmera piscando em flash. Alguns arriscam posições de yoga, formando um arco com as costas, malabarismos que me fazem pensar que tem um segundo emprego no Cirque du Soleil (são canadenses, eu sei, mas vá que?).
Tentam incansavelmente e até da pena, mas é quase impossível não deixarem vestígios, mesmo em uma casa vazia, mesmo em um cômodo pouco iluminado, afinal qual é a casa que não tem um mísero espelho que seja?
quinta-feira, 13 de novembro de 2014
terça-feira, 4 de novembro de 2014
Era uma vez...
Compramos uma bicicleta para o Fabian pela internet. Vinha 95% montada, eles diziam. Pois chegou com os pedais para encaixar (facílimo), o banco para ajustar, o guidon e o freio por arrumar e uma frescurinha de ferro para atar na parte ao lado da roda traseira. Passei por várias fases: a "bricoleur" entusiasmada, a mãe perdida, a adolescente irritada com a porcaria do manual que não diz como montar, a monja que meditava para não arrancar os cabelos, a louca que quase mastigou os parafusos de raiva, a política que sai para procurar alguém que faça o trabalho por si. A história teria um final feliz caso o cara que conserta bicicletas não quisesse 50 euros por fazer o que ele faria com um pé nas costas em dez minutos. Além dos cinquentinha, só vai deixar pronta amanhã. Resignada, anuí em pegar a bicicleta a partir das nove e meia da manhã. Podia ao menos sorrir né? Mas não, o cachorro labrador preto era muito mais cordial que o dono, me recebeu com o rabo abanando e me deu tchau lambendo minhas mãos. Quando a gente é assaltado assim, faz bem uma atenção destas!
Um dia de outono
De repente estava parada em frente à porta da escola do Fabian, levemente encostada no corrimão da ponte que nos leva até ela. Mulheres se aglomeravam a minha volta, falando, falando e falando. Por alguns instantes deixei correr solta minha cusquice habitual, falavam de carros mal estacionados e no quanto isto as enervava. Foi em um clique imperceptível, quando vi, já não estava mais lá. Uma gralha sobrevoou o céu cinzento e como em um feitiço qualquer, todas aquelas vozes transformaram-se em seu lamúrio animal. Crá crá crá. Retumbavam em minha cabeça. Crá crá crá.
Às vezes a solidão prega-me peças destas, em um minuto estou aqui e no seguinte já estou voando longe. Racionalizei que era-me muito fácil ignorar uma língua ainda estrangeira, uma língua que me diz pouco, quase nada. Chuto-a para o canto assim que ponho os pés dentro de casa. Não quero ver nem tampouco ouvir falar nela. E qual criança birrenta lembro-me do meu desespero quando me tornei emigrante pela primeira vez. Foi um parto difícil, sentia-me recém arrancada de todo o conforto que conhecia, senti-me lançada a uma luz fria, um terreno hostil. Pronta e nua, a vida disse depois de me parir: fiz a minha parte, agora estás por ti. Não era verdade que estivera só, mas ao mesmo tempo era. Há caminhos que só a solidão pode fazer sentido. Por muito tempo ouvir o português de Portugal me machucava, feria meus ouvidos como se tivesse em uma cela escura a ouvir intermitantemente o mesmo ruído de uma gota a pender rumo ao chão. Hoje não sinto mais esta gana de saber por toda a parte um idioma (ou sotaque) que não é meu, chamando-me à razão de que não pertenço aqui. Ao invés da raiva há o abandono, braços pendidos, pensamentos soltos em espiral.
Não sei se é do tempo...inverno e outono são para mim as estações mais deprimentes que existem. O céu em armadura opaca proibe o sol de aparecer, mantém-no prisioneiro semanas a fio. E mantém-nos igualmente em estado letárgico, enquanto nossas folhas desabam uma a uma até nada mais restar...
sexta-feira, 31 de outubro de 2014
Fica para a próxima
Fui assaltada por fantasmas e bruxas! Levaram-me todos os doces da casa!
Ano que vem estou pensando em pendurar na porta este cartaz, só não sei se os vai enxotar ou o contrário .A infância de hoje
Hoje basta um clique e meu filho pode assistir a um desenho em russo, chinês ou em português de Portugal. Não imagino o que ele consiga captar, mas bem que ensaia umas palavras em japonês ou inglês. Quando quer assistir algum filme, geralmente acabamos por fazer um jogo de adivinhações porque ele começa com "aquele filme, mãe, que tem um menino que sobe num coiso que vua", ou "aquele titio bem velhinho que tem uma casa de balão" ou ainda, "o do leão, do tigui e do pinguim". E quando por algum milagre decora o nome do personagem principal, sai com um "Jerry" (do Estranho mundo de Jack) ou "Bundo" (Dumbo).
Lembro-me da minha infância, de como era difícil ver o que quer que seja. Tinha de esperar dias a fio, amargar aquela vontade, aguardando que alguém tivesse paciência (e dinheiro) para locar uma fita a qual veria duas ou três vezes durante o período de aluguel. E o tempo que demorava para rebobinar a fita! Céus! E não podia entregar sem fazê-lo porque esta distração custaria mais 50 centavos no final. E quando a fita emperrava? E quando as cores sumiam ou estava estragada a ponto de não conseguir ver nada e ter de abandona-la ao fim de vinte minutos?
Será que aquelas pessoas que dizem de maneira tão arrogante que as gerações de hoje não sabem o que é ter infância lembram-se disto? Para elas infância é sinônimo de pés descalços, pião e cantigas de roda? Ah é verdade que hoje não se pode brincar livremente nas ruas, em parte culpa do trânsito que chegou em quase todos os lugares, em parte culpa do mundo que esta cheio de perigos. Se por um lado concordo que o crime tenha aumentado, por outro, há certos perigos que não conhecem época e sim, eu falo de abusos sexuais. Parece-me que naquela tempo as pessoas eram por demais embotadas nestes assuntos, e infelizmente as crianças pagaram por isto. Quando levo o Fabian para brincar na pracinha, fico sempre de olho no que está fazendo e com quem. Já lhe disse sobre a autonomia que tem sobre seu corpo e como eu queria que tivessem dito a mim anos atrás. Este é mais um dos motivos porque detesto gente que acha que protege crianças não expondo fotos na internet, mas que ao mesmo tempo é tremendamente irresponsável na vida real. Para mim são tão tolas quanto as que acham que tiveram o supra sumo da infância...
segunda-feira, 27 de outubro de 2014
Fabionices
Notando que era a quarta vez que cheirava aquele odor terrível, pedi para o Fabian parar de soltar puns. Depois de negar veementemente a autoria destes, olha-me bem nos olhos e sentindo-se vencido, diz:
- Mãe, a cacaca* disse que não pode parar!
*porcaria
Assim como são as pessoas, são as criaturas
Algumas pessoas estão de luto porque o seu candidato não ganhou as eleições. Já xingaram, espalharam a culpa pelos pobres, pelo bolsa família (que quando lhes convém reivindicam a paternidade do psdb), já compararam pessoas a porcos. Não vou fazer o mesmo com aquele ditado das pérolas, mas alguns dos discursos que li, se assemelhavam muito com o daquelas pessoas que pregam no centro, as que costumamos chamar lunáticas. Ditadura comunista? Onde? Quando? Se foi neste período em que tivemos maior enriquecimento de grandes indústrias e bancos com obscenos lucros? Que ditadura é esta que permite que sejamos constantemente livres para debitar desde indignações justas ao xenofobismo desnudo e livre nas redes sociais?
O Brasil precisa mudar, os brasileiros andam sedentos pela mudança e eu concordo. Mas e qual será a mudança que queremos? Diminuir a maioridade penal, acabar com o sustento de "vagabundos", acabar com as cotas nas universidades? Mais segurança para andar na rua? Se eu contasse minha história, possivelmente se dariam conta de que eu seria a última pessoa que pensaria em estar vivendo fora do Brasil, e muitos talvez julguem que por isto mesmo nem tenho razão de me manifestar. Mas como vivemos em uma democracia, também quero falar um pouco sobre mudança.
Quando pensamos em uma mudança social profunda, é inevitável não pensar em ganhar menos: em salários com menos discrepâncias face ao salário mínimo, e também em pagar mais impostos. Nós pagamos 50% de imposto e sim, é verdade que a França é um pais mais igualitário, mas também é verdade que para que assim seja, muita gente recebe benefícios do Estado. Nós não temos direito a nada, embora tenhamos um filho, talvez só a partir do segundo (mas isto agora não vem ao caso). O fato de pagarmos e não recebermos pode parecer injusto e eu confesso que havia um lado coxinha dentro de mim e foi preciso lutar para derrotá-lo. Garanto-vos que não foi necessário o uso da força: bastou abrir os olhos.
Aqui as pessoas recebem auxilio moradia, ou mesmo um lugar para morar com o custo de acordo com a renda, famílias recebem abonos conforme o número de filhos, as grávidas recebem 900 euros para gastarem no enxoval da criança (ou no que quiserem); o governo ajuda com o pagamento de babá ou creches (já que não existe estabelecimentos públicos voltados para a faixa de 0 a 3 anos) e finalmente, a partir da primeira série até o final do percurso escolar estas ganham por volta de 300 euros no início de cada ano letivo. Não é vergonha receber subsídios, é tão e só um direito de cada cidadão que se enquadra nas exigências do sistema. É claro que entre milhões de beneficiários, sempre haverá quem use de ma fé, no entanto isto não é motivo para invalidá-lo.
Um dia li uma crônica sobre um emigrante na Suíça falando que justamente o que fazia sentir-se seguro ao abrir um lap top nos transportes públicos, era o fato de receber menos. Porque entre o valor que um lixeiro ganha e um engenheiro, médico ou professor não há o abismo que encontramos no Brasil. Para dar um exemplo próximo, um salário de 3000 euros na Alsácia é considerado alto, e tendo em conta que o salário mínimo é 1445 euros, e quanto mais alto, mais pagamos, é bem difícil enriquecer por aqui.
Voltando ao Brasil, a questão que se coloca é o porquê da insistência acusatória dos que pagam as ajudas do governo através dos impostos, frente aos que recebem-nas. O problema está em sustentar "vagabundo" ou na impossibilidade da classe média e alta de desfrutar das mesmas benesses? O problema está na ignorância do valor irrisório do bolsa família ou na revolta por um vagaroso, porém crescente recuo da desigualdade?
E ainda continuo sem entender como se veste de luto quem rezou tanto para o Santo Aécio nos livrar do mal da corrupção. Um santo do pau oco, um santo que possui um aeroporto ligado ao tráfico de drogas nas terras de seu tio: uma obra de 14 milhões de reais desviados dos cofres públicos. Mas isto não interessa nada, afinal as pessoas queriam milagres e quando esperamos milagres principalmente de tais figuras políticas , abandonamos toda e qualquer lógica.
sábado, 25 de outubro de 2014
Ninguém assiste aos filmes do seu filho no facebook
Fato. Mas eu ponho mesmo assim. Hahahah!
Obs: tem legenda.
Obs: tem legenda.
terça-feira, 21 de outubro de 2014
Mudar para pior também é mudança
Assim que li pela primeira vez me surpreendi com tamanha indigência intelectual, mas depois achei digno, pelo menos assumia-se. Dizia a criatura que votava no Aécio Neves para presidente e sabia que ele não era flor que se cheirasse (desculpe o trocadilho*), mas que estava cansada do PT e que devíamos colocar outros para roubarem em seu lugar. Pelo menos era mais lúcida, que para mim esperar qualquer mudança para melhor no Brasil vinda deste candidato, é o mesmo que sentar à janela na véspera de Natal na expectativa de ver as renas passarem.
Não sou petista, e reconheço o mar de corrupção e alianças que o partido fez, no entanto, também enxergo todos os programas sociais e ações afirmativas que fizeram com que miseráveis se tornassem menos miseráveis. Que as gerações antes condenadas a seguirem os passos semianalfabetos dos pais, hoje conseguissem se escolarizar e entrar em uma faculdade pública .
Acho puro cinismo esperar que Aécio mude qualquer coisa que não sejam os nomes de quem irá mamar na teta de cargos de confiança. Acima de tudo, não aceito um discurso de exaltação da meritocracia vindo de alguém que nunca trabalhou na vida; alguém que encara politica como profissão, e que não por acaso, a tem como uma tradição familiar.
Vivemos hoje um estado de ódio febril, cego, hipócrita. Estas eleições apenas descortinaram o óbvio: a raiva à ascensão social, a intolerância da convivência em espaços antes exclusivos a uma elite retrógrada que acha o cúmulo pobre viajar de avião (alô Danuza!), agora timidamente conquistados pelos últimos. Ainda nos trouxe o grito de direita de uma classe média com aspirações burguesas, que vê-se espremida entre o povão e cada vez mais longe do seu padrão de desejo.
É sucesso garantido gritar digital e histericamente um #foradilma, #foraPeTralhas, #vtcpresidANTA. Os likes de aprovação vem em reflexos tão automáticos quanto uma martelada no joelho. Mas infelizmente isto não passa de um retrato de gente que não vai além disto, não sabem porque nem quando, não sabem debater propostas dos candidatos e acima de tudo, não sabem que o trem para a mudança passou, com alguma sorte, no primeiro turno. Mas pelo menos se o Aécio ganhar, haverá quem fique satisfeito por alguém diferente estar roubando que não o PT. Em alguma coisa eles tem razão: do jeito que está não podemos ficar, e não vamos mesmo...vamos ficar é muito pior.
segunda-feira, 20 de outubro de 2014
Ponte Aérea
O marido esteve em casa neste fim-de-semana e passou tão rápido como um sopro. Mal deu tempo para nos acostumarmos à rotina de casal e já era domingo à tardinha... Nunca a famosa depressão de domingo fez tanto sentido. O pai despede-se do filho, da um beijo ligeiro à mulher e sai rumo ao aeroporto. E de repente lembro-me da nossa trilha sonora de ultimamente. Assim chegar e partir são só dois lados da mesma viagem, (...) a hora do encontro é também despedida. Vivemos em espasmos contados; horas e segundos marcados, vivemos mais, talvez com a ansiedade de alguém consciente do pouco tempo de vida que lhe resta.
Depois dele ir, o tempo volta a viajar em carro de bois, sacolejando distraidamente os centésimos de segundos que duram uma eternidade para partirem. Ja dizia-se que o tempo é relativo, e é. Pena mesmo que o amor não seja.
quinta-feira, 16 de outubro de 2014
Fabionices
O Fabian chega para mim todo esbaforido:
"Sabi mãe, que eu tava na escola i ouvi um bauio e a metesse (professora) disse que a gente tinha que corrê bem rápido poque tinha fogo e a escola ia expludi."
"Sabi mãe, que eu tava na escola i ouvi um bauio e a metesse (professora) disse que a gente tinha que corrê bem rápido poque tinha fogo e a escola ia expludi."
Eu disse-lhe "é mesmo?" com a cara de falsa surpresa de sempre, a constatar de que se tratava de mais uma das suas histórias mirabolantes. No entanto, quando voltei ao assunto, percebi que só podia ser um treinamento de evacuação. Perguntei-lhe se foi divertido e ele disse que sim, só ficou desapontado porque o homem aranha não apareceu!
quarta-feira, 15 de outubro de 2014
Casamento à distância
Cada relação é um mundo à parte mesmo. Tem gente que se ama tanto que o melhor é ficar longe, tem quem não suporta ficar separado nem mesmo por um cômodo da casa, tem quem mande emails todos os dias, e quem não telefone nunca. E se os dois se acertam e são felizes, por mim tudo bem. Agora, na minha vida é difícil conceber um casamento à distância porque a minha forma de amar exige mãos, (a) braços, o chão cheio de farelos e à noite a cantiga clássica de roncos que me faz adormecer há oito anos. Sei e repito cada vez que um pensamento derrotista vem à baila, que foi uma escolha nossa e até onde se saiba, uma escolha temporária. Perguntam-me quando vamos ficar juntos novamente e não é por falta de vontade, mas realmente não sabemos. Se fosse por mim já estávamos no apartamento novo, o Fabian na escola, o meu cachorro entre as almofadas do sofá. E é uma pena que não possa hibernar até estar tudo nos eixos novamente. O que me resta é tentar conviver o melhor possível com a solidão, visita tão constante aqui de casa que já vem de chinelos...
Tem horas que acho que vou enlouquecer ( um pouco mais do que o normal), porque se estar sozinho em uma situação de mãe solteira já é complicado, estar sozinha como mãe solteira em um país em que não se pode contar com ninguém, é exasperante. Costumo dizer que temos conhecidos, não amigos, por isto acho tão difícil esta relação à distância. Ficamos um mês sem nos ver, e agora o marido vem de quinze em quinze dias, o que até muito bom para quem já ficou meio ano separado. Mas isto não invalida o que sinto. Deixou de doer, é verdade. Mas não quero me acostumar, recuso-me a me acostumar, porque o dia em que conseguir, não valerá de nada estarmos juntos.
quinta-feira, 9 de outubro de 2014
O circo da morte no "fakebook"
Foi um fato que a tia fez de tudo para manter uma certa privacidade sobre a doença que enfrentou e pela minha parte sempre a respeitei e imagino que no seu lugar também teria tomado esta decisão. As pessoas que são importantes sabem, ou saberão ao seu tempo...mas a maioria está ali apenas como urubu rondando carniça: bebem os detalhes e saem com um dó fingido, a prometerem rezar já que não há mais o que fazer.
Lembro-me das horas que passamos ao telefone, quase 90% dos assuntos giravam à volta das banalidades da nossa vida na França, da adaptação à língua, das gracinhas que o Fabian fazia. Achava que era eu quem tinha de escutar, mas obviamente ela não queria falar de morte. Ela queria falar de vida. Como se os momentos ordinários dos meus dias fossem qualquer coisa de tonificante para seu organismo debilitado...
Acredito que a família esteja no seu direito em manifestar a dor, escrever bilhetes ou cartas em memoria dos que nos deixaram, mas acho de um oportunismo e falta de sensibilidade sem medida, pessoas que não convivem há pelo menos uma década e que nunca se importaram de saber se a criatura estava viva ou morta se manifestem. Que digam de sua (in)justiça nos posts de quem realmente sente a perda, mas que façam-no em seus perfis à procura de likes é simplesmente mesquinho.
Admira-me que através de um amigo em comum, tenha pedido para uma "amiga" pesarosa parar de postar coisas sobre a nossa família em respeito à decisão da minha própria tia, e que a pessoa além de ignorar o meu apelo, posta mais coisas como que por birra. Parece que algo lhes sobe à cabeça, talvez qualquer espécie de estatuto de luto em que as pessoas todas lhes abraçam e dão-lhes tapinhas nas costas virtuais. Mesmo que isto não lhes diga respeito, mesmo que em razão disto, atropelem o bom senso e a educação. Deixo um recadinho a esta mulher irritante e sem noção, como diriam os franceses: Tereza, tu m'emmerdes*.
* Aparentemente merda virou um verbo, e eu gosto disto.
quarta-feira, 8 de outubro de 2014
Hoje
Hoje quero mentir que os meus olhos vermelhos são fruto da tinta do cabelo que escorreu-me marrom pelo corpo. Que a água quente lavou as picuinhas que um dia tivemos, deixando um borrão de sorriso no lugar dos beiços tremidos. Hoje quero lembrar da mulher que considerei no alto dos meus quatro anos a mais bonita do mundo. Quero lembrar das nossas risadas soltas, das unhas dos pés (e das mãos) que não confiava a mais ninguém senão a ti. Hoje queria fingir que nunca existiu este hiato que nos afastou e que engolir a besta do meu orgulho foi a melhor coisa que fiz. Hoje queria não ficar imaginando a hora em que contarem para eles aquelas historias sobre o papai do céu. Hoje mais uma vez estou longe, longe demais, longe do alcance de um cafuné e um beijo de despedida. Hoje quero mandar à merda esta maldição que me faz prever o futuro...caramba, puta que pariu... eu não queria estar certa, eu queria que tu ficasses, tia.
terça-feira, 7 de outubro de 2014
quinta-feira, 2 de outubro de 2014
Hecatombe romântica
Devia ter-lhe dito que às vezes o amor era uma substância estranha que salivava pelos poros, que a fazia febril e titubeante. Devia ter-lhe dito que o raciocínio tinha-na abandonado, que o corpo soluçava de abstinência dos seus beijos, das mãos escorregadias pelo seu sexo... Ela devia ter-lhe dito. Devia ter insistido, mesmo que perdida em pensamentos obsessivos de solidão, pensamentos estes que faziam-na andar aos círculos como um cachorro que morde o próprio rabo. Ela vagava noites a pensar, a ouvir "Bésame mucho" em espiral, sentindo-se lúcida na fraqueza de seu próprio sofrimento. Devia ter-lhe dito que o tempo o havia atenuado com uma catarse diária, expulsando as vozes que chamavam-lhe sem permissão. Seu coração desacelerava. O pulso. A vida. Desacelerava. Ela devia ter-lhe dito. Mas não disse. E ele voltou a tempo de intoxicá-la novamente.
Amore, fai presto, io non resisto...
Se tu non arrivi, non esisto, non esisto...non esisto...
A primeira vez que ouvi esta música foi em "Onze Homens e Um Segredo", já no finalzinho do filme e fiquei cantarolando mentalmente, pensando que ela não me era nada estranha. Até que fez-se luz: música brasileira, da época da Jovem Guarda na versão de Ornella Vanoni. Mas depois que descobri esta, estou completamente apaixonada... Não fosse a mesma também dizer algo que tenho pensado muito nestes dias...
quarta-feira, 1 de outubro de 2014
"Me caiu os butiá do bolso"
Uma expressão lá da minha terra que significa nada mais do que espanto, isto foi o que senti quando em um grupo de brasileiros na França, uma francesa com apenas sete meses a morar no Brasil, escreveu muito melhor que 99% dos meus conterrâneos. Não quero de maneira nenhuma soar elitista, pois sei que fui uma privilegiada por ter estudado em escola particular, e também não falo de erros que exigem um maior conhecimento da língua portuguesa, mas tão e somente dos erros mais comuns que, com um pouquinho de boa vontade, poderiam ser curados. Voçê com cedilha, encomodar com "e", "inguinorância, "pesso" (ao invés de peço), mim conjugando verbo (exemplo: "mim" adiciona no face). É tanto erro junto e alguns são tão frequentes, que há momentos em que tenho de pensar bem se sou eu quem está escrevendo errado.
Ainda estes dias deu uma briga porque alguns se sentiam desconfortáveis com a correção dos outros. O problema é que quem corrigia soltava vez por outra erros tão bobos como aqueles que criticava. Enfim... de todas as vezes que um francês escreveu um tópico no fórum, saíram-se muito melhor do que um nativo e ainda por cima, não se atreveram a corrigir ninguém.
segunda-feira, 29 de setembro de 2014
sexta-feira, 26 de setembro de 2014
Passeio de francês
Quarta feira passada o Fabian teve um passeio na escola, o primeiro deste ano letivo. A mãe aqui, escreveu o nome dizendo-se disponível todos os dias, assim como fiz no outro ano. Quando a professora chamou para ajudar a cuidar das crianças, imaginei que ia ser moleza como nas duas vezes em que o fiz, a prefeitura liberaria o ônibus que iria nos levar e buscar na porta da escola. Ledo engano. Segunda veio um bilhete para casa avisando-nos para comprar passagens de ida e volta para o tram. Fiquei responsável por quatro alunos, incluindo o meu filho, todo o caminho à pé até a estação (uns 10 minutos), no tram, na descida, no outro tram e finalmente na caminhada 15 minutos até o museu de arte moderna.
No Brasil há uma expressão para isto: chama-se passeio de índio. Imagino que porque andar no mato seja algo ao mesmo tempo sem atrativo e perigoso. Achei que a professora não foi minimamente feliz em propor esta atividade, primeiro pelo trajeto que levamos boa parte do curto turno de três horas. Depois, pelo lugar. Pelamordedeus, museu de arte moderna?? Se eu tinha que me conter a cada minuto para não bocejar, como esperar que crianças de quatro a cinco anos achem aquilo interessante a ponto de ficarem quietas e prestarem atenção? Se ainda fosse um museu de arte com uma seção voltada ao público infantil ou com obras mais apelativas, mas não...colocaram-nas meia hora a olhar dois quadros acizentados de baixo relevo. Depois a ver um vídeo em que cães da raça weimaraner faziam coisas como se fossem humanos, com mãos humanas, mas com uma espécie de esqueleto de roupas à frente. No fim, a mocinha bem intencionada que os guiava, lhes propusera uma crítica às histórias infantis cujos personagens imitam nossos dramas de todo dia. Não sei se foi só eu que reparei, mas acho que a única coisa que realmente crianças daquela faixa etária poderiam aproveitar era o desenho com confetes, que pelo tempo, não deu para fazerem.
Sem lanche nem água a manhã toda e com a volta tendo que descer duas estações antes e caminhar pelo atraso do tram, este passeio alcançou outro nível de chatice. Passeio de índio que nada, ida a um museu, ainda mais museu de arte moderna, foi passeio de francês mesmo.
quarta-feira, 24 de setembro de 2014
Descobri
Pessoas que vem ao meu blog e descobrem que eu tenho um problema. E eu achando que não era a única, mas vai se a ver eu sou. Tenho um "problema", tenho defeitos e muitos. mas será que sou pior apenas porque falo deles, que os enxergo e admito ou deveria ser como estas pessoas que (fingem que) não tem problema nenhum?
Acho que falta muita interpretação, ou boa vontade ou honestidade intelectual. Uso este espaço para desabafar, sempre o fiz. Mas podia ter feito diferente, podia. Podia ter criado um blog cor-de-rosa, um personagem disney que acorda e os passarinhos a ajudam a se vestir, que espera o príncipe encantado chegar com o sapato de cristal. Ao invés disto, escolhi desnudar-me, deixei cair pedaços de mim em palavras soltas aqui e ali. Palavras por vezes soltas em horas de raiva, de desespero, de medo ou solidão. Palavras felizes e saltitantes, de escárnio, de ciúme, de amizade.
Eu não sou uma só, nem tampouco caibo em uma folha de papel virtual. Para falar a verdade, eu nem caibo em mim mesma... mas uma coisa é certa: alguém sempre deixa um pouco de si no que leu por aqui.
domingo, 21 de setembro de 2014
Parede indiscreta
Não tem aquele filme Janela Indiscreta em que um cara fica observando os vizinhos até que presencia um assassinato? Pois é. Estava eu aqui bem bela na noite de sábado, já me preparando para assistir um filme, quando escuto vozes exaltadas vindo sei lá de onde. Levanto-me e o primeiro pensamento correu pela janela. Moro em um lugar extremamente calmo e se não fosse pela lanchonete árabe do outro lado da rua, mal se ouviria barulho de carro depois das oito da noite. No entanto, lá estavam os gritos a invadirem minha casa. Abri discretamente o vidro e espiei pelo friso que a janela de madeira permite. Nada, um silêncio só. Tal e qual um cão farejador, põem-se toda e qualquer fofoqueira que se preze, a captar a trilha que levará até vozes abafadas. Não demorei muito para dar com o ouvido na parede crespa do hall de entrada. Eram os meus vizinhos franceses que ao invés que lavarem roupa suja na casa deles, resolveram fazê-lo na escada. E a escada dá para o meu hall. Literalmente não fui eu quem procurei o babado, ele é que veio atrás de mim, entrou pela sala e me convidou a segui-lo.
Eu nunca tinha escutado a voz da vizinha, a não ser quando ela gemeu e chamou a Deus, sacudindo os móveis certa noite. Mas de verdade que eu não lembrava da voz da alemoa e mesmo que lembrasse, penso que em nada se assemelharia àqueles gritos desvairados, ao choro e aos tapas que, acredito, encontraram qualquer parte do marido rechonchudo.
E o que mais me intrigava era: o que diabos esta mulher fez com a pessoa calma e polida que eu conhecia de vista? Só escutava uns "merde" "tu es insupportable", "faz onze meses que eu não durmo", esta palavra se repetia já que o casal tem um filho de precisamente onze meses. "Je n'arrive pas à dormir" e bla bla bla, que o presente de aniversário foi uma merda, "nussa", que será que o homem lhe deu? Um aspirador de pó automático?
Os gritos continuavam cada vez mais altos, enquanto que a voz do homem irritado, porém com algum controle arranjava ora desculpas, ora acusações. E lembrei-me que já não estava traduzindo nada, apenas pensava na possibilidade de ter de ser testemunha de um crime passional, meu Deus, esta mulher vai realmente matar este homem!
Ficaram ainda meia hora a discutir, até que os ânimos se aquietaram e pude finalmente ver o meu filme com certa melancolia de não estar tão bem no francês como eu julgava. Minhas habilidades estão assim: entender o que o interlocutor fala (check); compreender desenhos animados (check), falar coisas básicas como "onde-fica-o-banheiro" (check); desvendar as discussões dos vizinhos por uma parede grossa com gritos e soluços pelo caminho (no).
Pelo menos deu para reparar que apesar de toda a politesse, quando o negócio tem que descambar, descamba. A francesa rodou a baiana e lavou a escadaria do Bom Fim de um modo que eu jamais imaginaria. E depois nós os latinos é que levamos a fama!
sexta-feira, 19 de setembro de 2014
Fabian vocabulário
expemimenta - experimenta
pegui, janti, guardi, já buti
suco di lalanja
faquibuque (facebook)
quéur - coeur
ciulme - filme
sutibol - futebol
apúqui (hamburguer)
boboleta
fiquileta (bicicleta)
mose (ônibus) - ômis (plural de ônibus)
patel (quartel do marcha soldado)
comaín (mackeen)
Guti (Woody), Buslatiu (Buz Light year)
pananapo (guardanapo)
pampufa (pantufa)
pista - pizza
cutadôie - computador
mamamagasca - Madagascar
Bundu - Dumbo
Lidu - Lidl
Caca cola - Coca Cola
pegui, janti, guardi, já buti
suco di lalanja
faquibuque (facebook)
quéur - coeur
ciulme - filme
sutibol - futebol
apúqui (hamburguer)
boboleta
fiquileta (bicicleta)
mose (ônibus) - ômis (plural de ônibus)
patel (quartel do marcha soldado)
comaín (mackeen)
Guti (Woody), Buslatiu (Buz Light year)
pananapo (guardanapo)
pampufa (pantufa)
pista - pizza
cutadôie - computador
mamamagasca - Madagascar
Bundu - Dumbo
Lidu - Lidl
Caca cola - Coca Cola
Torrafia - fotografia
Badachuva / dadachuva - guarda-chuva
Táqui - taxi
Chiquileti - chiclete
Homem anhanha
Fanstasma - fantasma
vô ti ixpicá
carro di iscorrida - carro de corrida
Fanstasma - fantasma
vô ti ixpicá
carro di iscorrida - carro de corrida
quinta-feira, 18 de setembro de 2014
Quinze coisas aleatórias sobre mim
1 - Pego o sotaque de duas pessoas com quem gosto muito de conversar em questão de minutos: uma é mineira e a outra do interior do Rio Grande do Sul. Mas posso morar anos em um lugar e continuar a falar como sempre falei.
2 - Se me dissessem há quinze anos atrás que estaria casada com um homem bem mais velho do que eu e vivendo fora do meu país, eu nunca acreditaria.
3 - Uma das coisas que mais me dá prazer na vida é escrever. Se deixasse a preguiça de lado, bem podia escrever um romance ou uma coletânea de contos, nem que fosse apenas para guardar para mim.
4 - Quem me conhece inicialmente me acha antipática. Sou muito na minha e só vou pegando confiança aos poucos.
5 - De animais de estimação já tive: gato, coelha, hamster,periquito, cachorro, tartaruga. Atualmente tenho três peixes, mas são de longe os bichos mais aborrecidos para se ter. Falando nisto, não tem dia que não pense no Yoshi, meu cachorrinho que ficou no Brasil. Se der tudo certo, ano que vem ele estará com a gente de novo!
6 - Falo sozinha. Muito. Ihh...agora ainda mais.
7 - Houve um tempo em que pensei em virar freira. Ainda bem que passou rápido, só de saber a hora que elas acordam para rezar.
8 - E sim, odeio acordar cedo.
9 - Posso estar louca para ver um filme, mas se for dublado desisto na hora. Tenho uma saudade enorme de ir ao cinema e pelo visto vou ficar muito tempo ser ir (já que aqui mesmo no cinema os filmes são dublados).
10 - Adoro fotografia e tenho jeito para a coisa. Precisava era de uma câmera melhor e paciência também para ler os manuais.
11 - Sonho todas as noites há quase dois anos com uma casa. Ou a casa é de alguém, ou é minha, ou estou procurando uma casa para alugar, ou é uma casa de praia da minha infância. Enfim, é o subconsciente querendo falar alguma coisa.
12 - Passo muito bem sem maquiagem, no máximo um gloss e olhe lá. Reboco só mesmo se for alguma festa ou ocasião especial.
13 - Tenho gostos por cheiros estranhos: amo cheiro de gasolina, de terra molhada e de mofo. Não necessariamente nesta ordem.
14 - Já tive mania de limpezas e de organização, hoje já estou bem mais moderada, mas ainda gosto de colocar os controles um ao lado do outro.
15 - A maioria das pessoas que conheço tem o sonho de morar em Paris, eu devo ser um E.T., mas iria detestar a ideia. Só vou obrigada, isto é, se não der certo em Nice, o mais provavelmente é irmos para lá (blerc).
Este desafio foi proposto pela Timtim e eu deixo para quem sentir vontade, mesmo que não tenha blog, se quiser dizer algumas palavrinhas :)
quarta-feira, 17 de setembro de 2014
La rentrée
Acompanhei net à fora os desabafos das mães na volta às aulas e, embora aqui já tenham começado há mais de duas semanas, tivemos algumas mudanças. A pior ao meu ver, foi ele ter trocado de sala e por consequência, de professora. Ah, que saudades madame Fisher!! Mesmo tendo o seu jeitinho para lá de especial à moda alsaciana, ou seja, apertos de mão, sorrisos à parte, a ex prof (vou chamar assim para me lembrar do Brasil) era muito paciente com ele, até lhe dava tapinhas nas costas quando chorava! Vê só.
Eu não sou uma daquelas mães que quase se derramou em choro e ranho na porta da escola, aqui levamos tudo naturalmente, ainda que o rapaz esteja em outro país e necessitando com urgência aprender a língua francesa. Acabaram-se as tardes dormindo em casa, levei um senhor puxão de orelha da prof atual porque ela acha que três horas pela manhã é pouco. Todas as segundas ele e mais quatro colegas vão ter reforço com ela até às 16:20. Ah isto é outra coisa que mudou, não bastava a gente viver em função de pegar filho-levar filho, decidiram que às quartas feiras pela manhã vai ter aula. Mas para compensar, resolveram tirar uma hora dos outros quatro dias no turno da tarde, ficando assim: 8:30 até 11:35, retornando à 13:30 até às 15:35. Prontos, não se faz mais nada. Esta reviravolta na rotina resultou em abolir de vez o soninho e agora vou reorganizar o jantar e banho para que às 20 horas mais coisa menos coisa, estejam ele o "homem aranha" na cama. Espero que a próxima escola que matricularmos tenha cantina para que eu possa me dedicar a fazer mais cursos e praticar mais o francês. Já fiz um ano aqui, bolas, já está na hora de parar de brincar de mímica e falar frases mais conexas com início meio e fim, sem aqueles hummm... hãã...que tanto me irritam.
terça-feira, 16 de setembro de 2014
Alguém quer mesmo se parecer com uma boneca inflável?
Quer! Uma modelo francesa com a ajuda do namorado italiano passou por uma série de cirurgias plásticas a fim de parecer com uma boneca, não aquelas feita de silicone com esqueleto de metal (embora ela tenha usado muito), consideradas o top do prazer solitário.
Nada disto. Ela queria se parecer com estas:
Agora a pergunta que não quer calar...como alguém consegue viver com uma bunda no lugar de peitos?
As coisas que o marido conta
Há mais de duas semanas no trabalho novo, ele já reparou em algumas coisas no mínimo inusitadas. O pólo da empresa se situa em um parque de difícil acesso e por isto a mesma disponibiliza navettes* para o povo que não tem carro ou força de vontade no lombo para a subida que é até ali. E é no que o marido vai, mas ele tem um colega que vai de bicicleta, vestindo camisa social, calções de ginástica, meia e sapato de trabalho. Mas não é só isto. Ele chega na sala, onde se encontra a sua mesa e mais cinco, fecha a porta e troca de roupa ali mesmo na frente deles. Eu perguntei ao Fernando: mas e se alguma mulher entrar? Ele diz que as pessoas batem na porta, mas o homem não está nem aí, faz o que tem que fazer com a maior naturalidade do mundo.
E outra coisa interessante, é o campeonato que os colegas estão fazendo. Logo no primeiro dia, o marido reparou em um quadro de avisos em que estava escrito o nome de todos eles, ao lado de um número. Mesmo intrigado, não perguntou nada. Também não precisou. Nas primeiras horas enquanto tentava se concentrar em ler os manuais da nova linguagem que tem de dominar, ouvia seguidamente uns plaft. Plaft. Pumb. E lá alguém se agitava em triunfo com uma mão para cima, Menos um, ou será mais um? Sim, isto mesmo, eles fazem campeonato de quem mata mais mosquitos, o que naquele lugar húmido e recheado de mato, é o que mais deve ter. Não basta apenas matá-los, tem de erguer os restos diminutos (não sei se ganha mais se tiverem sangue) e mostrar a todos para que se registre no quadro.
O marido decidiu se abster daquilo, uma porque sequer enxerga as aranhas de dez centímetros aqui de casa e outra porque atrapalhado do jeito que é, ainda era capaz de derrubar o computador no chão. Sendo assim, apesar da saudade, eu que não queria ser uma mosquinha nem um mosquito ali naquela sala... mesmo que fosse para ficar mais perto dele!
* vans
segunda-feira, 15 de setembro de 2014
A turca
Passei por ela duas vezes na subida para a escola. Vinha pendendo para os lados com as mãos na ilharga, o vestido até os pés e o lenço amarrado na cabeça. Lembro-me desde a primeira vez que a vi, há um ano atrás, pensei que estivesse doente tal era o tom pálido amarelado e as olheiras profundas e roxas que a destacavam da aglomeração de pais à espera. Fora isto, a expressão de alheamento, o lábio costurado em uma linha reta a qual nunca vi curva alguma. Não foi nenhuma surpresa quando ela desabou minutos antes do sinal tocar. Alguém soltou um grito, mas creio não ter sido ela. Caiu sem sequer suspirar, os olhos plenamente brancos até ir encontrando ombros pela descida.
Dias passaram-se, e o seu menino era trazido ou levado por outra pessoa. E quando finalmente ela apareceu, trazia o ventre inchado como se alguém o tivesse soprado na noite anterior. As olheiras ainda mais cavadas na pele sobre o tom pálido de sempre.
Dizem que a gravidez traz um brilho especial a muitas mulheres, olhei-a disfarçadamente e constatei que infelizmente não foi o caso. Às vezes meu lado cusco quer perguntar o porquê daquela tristeza, mas me atenho ao fato de que parece que aquela mulher nem está mais aqui. Se me atrevesse, imagino que minhas palavras caíssem a seus pés bamboleantes, e que ela as pisasse distraidamente como se o fantasma fosse eu...
Dizem que a gravidez traz um brilho especial a muitas mulheres, olhei-a disfarçadamente e constatei que infelizmente não foi o caso. Às vezes meu lado cusco quer perguntar o porquê daquela tristeza, mas me atenho ao fato de que parece que aquela mulher nem está mais aqui. Se me atrevesse, imagino que minhas palavras caíssem a seus pés bamboleantes, e que ela as pisasse distraidamente como se o fantasma fosse eu...
sábado, 13 de setembro de 2014
Vamos ver se nos entendemos
Situação nada hipotética na minha vida. Sabe aquele momento que senta ao teu lado uma mãe e desata a falar e reclamar que não tem sossego, que como os filhos roubam tempo e paciência e patati patatá? E depois com a cara mais deslavada do mundo, abre um sorriso colgate e pergunta: mas compensa né? Eu acho que a pergunta em si é retórica, mas mesmo assim faço um esforço de imaginação. Quem sabe daqui uns anos, quando ele estiver um homem feito, quando estiver discursando num púlpito de uma universidade qualquer, quando tiver casando com a pessoa que ame, quando estiver pegando nos braços pela primeira vez alguém que ajudou a fazer, quem sabe um dia, quem sabe talvez, eu diga que sim, que compensou. Até agora a resposta é um grande e redondo NÃO.
quinta-feira, 11 de setembro de 2014
Vida de emigrante
Com sete anos vivendo fora do Brasil, eu já não me deslumbro com isto. Pelo contrário, às vezes fico muito sem graça quando alguém diz com aquela pompa que moro na Europa. Ah péra, to recebendo um telefonema da França! Antes eu confesso, logo que tornei-me emigrante que sentia lá no fundo uma ponta de orgulho, um orgulho absurdo e bem escondido, pois nem eu mesma sabia o que faria com ele. Afinal, orgulho de que mesmo? Não sou um ser especial só porque vivo fora do meu país. E por acaso nem é a mim que concedem este título, mas é me transmitido pela crença de que "nas Europa" vive gente educada, sim, muito honesta, onde tudo é lindo, muito bom. E por convivência, esta civilidade seria me passada através de uma espécie de osmose cultural ou coisa que o valha.
Eu já deixei-me disto no momento em que pus os pés em Portugal, e creio não ter levado um ano para livrar-me completamente desta síndrome de vira-lata que acomete quase todo o brasileiro, inclusive aqueles que moram fora do Brasil. E o antídoto é de graça, e não dói. Ao menos a mim não doeu (tanto).
Para aqueles que sonham deslumbrados com o país das maravilhas, só recomendo-lhes aquela música do Titãs: "quem espera que a vida seja feita de ilusão, pode até ficar maluco ou morrer na solidão". Não há perfeição aqui fora, há pessoas de todos os tipos: educadas, mal educadas, que só querem se dar bem, e pelo amor do meu saco de paciência, o jeitinho "brasileiro" é universal. E muitas, muitas vezes as pessoas só não fazem mais, não porque sejam moralmente superiores, mas porque há um tácito acordo de entre-vigias. Se eu não posso, fulano também não pode, porque se fulano fizer e não der nada, eu vou atrás.
Depois de um ano na França, descobri que para ser mal educado é só preciso falar "pardon", que funciona como um passaporte dando-me o direito inclusive, de tirar as pessoas do lugar que ocupam para eu sentar. Não, eu ainda não me utilizei dele, mas já fui confrontada com esta atitude mais vezes do que gostaria. E ontem foi o estopim, quando uma mulher de quase 200 quilos passou-me à frente na fila para pegar o seu filho na mesma sala, e quando eu suspirei, ela desatou a xingar-me para toda a escola ouvir. Ai de mim que não respeitei o código do "pardon", minhas desculpas, senhora, por não tê-la deixado ser mal educada em paz...
Depois quando escuto algum brasileiro a falar só maravilhas do exterior, eu penso silenciosamente, "coitado...se ficar mais tempo ainda vai ver-se nu desta ingenuidade toda". E vai doer mais nele do que doeu em mim.
Depois quando escuto algum brasileiro a falar só maravilhas do exterior, eu penso silenciosamente, "coitado...se ficar mais tempo ainda vai ver-se nu desta ingenuidade toda". E vai doer mais nele do que doeu em mim.
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