terça-feira, 9 de abril de 2013

Bolinho de arroz

- Pshiu. A mãe disse que não era para falar.
- Não era para falar o que? - pergunta a mais nova.
- Que o Tonico morreu.
- Ah. Mas ela não sabe?
- Saber, sabe. Viu ele.
- Viu?
- Viu. Todo de branco e cheio de flores.
- Mas se viu porque não pode falar?
- É para não lembrar. Cada vez que se lembra chora que só ela.
- Então e o que dizemos? - Aprumou a saia florida e pôs cuidadosamente as sobras de tecido para baixo das pernas.
- Qualquer coisa. Ou talvez nada.
- Acho que é melhor não dizer nada.
- Isto.
-Olá, Martina, olá Maria.
- Olá. Respondem as meninas em  uníssono.
- O que querem para o almoço? - a empregada coloca o avental e dirige-se à sala novamente.
- Quem sabe bolinho de arroz? - diz a mais nova.
A mulher estanca e com os olhos sem vida pára em direção à janela. O reflexo do vidro desenha seu nariz largo e negro. Os lábios amarronzados se entreabrem e começa a balbuciar - ele...ele...- não termina a frase e lágrimas grossas rolam pela sua cara de cera.
As meninas ficam por segundos a olharem-se e depois fogem para o quarto. A mais velha muito enraivecida:
- Está satisfeita agora? O que a mãe disse?
- Mas...eu não falei nada...
- Não lembra, o Tonico que gostava de bolinho de arroz. Agora a mãe vai ficar braba. Quero só ver se ela vai contar e vai sim. Agora é tua vez de ficar sem sobremesa.
A mais nova cala, calou durante todo o almoço. Era o morto que não lhe saía da cabeça, assim como também não lhe saía a ideia de que os bolinhos estavam salgados demais...

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